HAVERÁ CANTORIA DIA 13 DE DEZEMBRO, 2014, A PARTIR DAS 20h NO BAR DE GENECI MELO EM CAPUAVA SANTO ANDRÉ SÃO PAULO, COM OS POETAS: GILSON MELO & JOSÉ FERREIRA E DEMAIS POETAS; ORG: GENECI MELO E AMIGOS.
Zezo Correia trabalhando o tema “A vida de um passarinho”:
Canta a cauã com agouro Em cima de uma aroeira No ninho da quixabeira Canta a casaca-de-couro Eu admiro é um louro Lá no oco apertadinho Dentro criar um filhinho Com tanta satisfação Causando admiração A vida de um passarinho.
Vê-se um maracanã Rasgando espiga de milho Pra dar comer a seu filho Todo dia de manhã Também vejo a ribaçã Pôr pelo chão sem ter ninho Deixar o ovo sozinho Depois tirar sem gorar Isso faz admirar A vida de um passarinho.
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Espedito de Mocinha
Eu nasci e me criei Aqui nesse pé de serra Sou filho nato da terra Daqui nunca me ausentei Estudei, não me formei Por que meu pai não podia Jesus, filho de Maria De mim se compadeceu Como presente me deu Um crânio com poesia!
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Pedro Bandeira
Quero a minha sepultura Na sombra de uma favela Onde morreu minha vaca E meu cavalo de sela Pra ninguém saber se os ossos São meus, do cavalo ou dela.
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Dedé Monteiro
Cantador pra imitar o triplo gênio De um Xudú, de um Filó e de um Geraldo, É preciso que tenha um grande saldo De grandeza, de fé, de oxigênio; E, além disso, passar quase um decênio Preparando o bogó do coração Pra juntar ferramenta e munição Necessárias na guerra das ideias Que provoca o delírio das plateias Embaladas por tanta inspiração.
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Diniz Vitorino
Vemos a lua, princesa sideral Nos deixar encantados e perplexos Inundando os céus brancos de reflexos Como um disco dourado de cristal Face cálida, altiva, lirial Inspirando canções tenras de amor Jovem virgem de corpo sedutor Bem vestida num “robe” embranquecido De mãos postas num templo colorido Escutando os sermões do Criador.
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Jó Patriota
Mesmo sem beber um trago Sinto que estou delirando Tal qual um cisne vagando Na superfície de um lago Se não recebo um afago Vai embora a alegria A minha monotonia Não há no mundo quem cante Sou poeta delirante Vivo a beber poesia !
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Pinto do Monteiro Minha corda não se estica Não se tora nem se enverga Da terra pro firmamento Meu pensamento se alberga Em um lugar tão distante Que lente nenhuma enxerga.
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João Paraibano
Quando o dia começa a clarear Um cigano se benze e deixa o rancho A rolinha se coça num garrancho Convidando um parceiro pra voar Um bezerro cansado de mamar Deita o queixo por cima de uma mão A toalha do vento enxuga o chão Vagalume desliga a bateria Das carícias da noite nasce o dia Aquecendo os mocambos do sertão.
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João Igor
Poeta desde criança Cantador desde menino Acho que é dom divino Não existe semelhança Ainda tenho esperança De um dia aparecer Alguém para me dizer Ou tentar me explicar Se o que me faz cantar É o que me faz viver.
Inda não se descobriu É um mistério da ciência Todo tipo de experiência Nenhum efeito surtiu Até fora do Brasil Já tentaram entender Mas não tem o que fazer Tenho que me contentar Se o que me faz cantar É o que me faz viver.
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Marcos Passos
Pinte o quadro da lembrança Com o pincel do pensamento; Recorde o encantamento Dos bons tempos de criança! Sinta luzes de esperança Brilhando cor de marfim; Contorne o painel carmim Que a inspiração desenhou E diga pra quem sonhou: Poesia se faz assim!
No caldeirão da saudade Junte a tristeza que chora Com o riso que foi embora Nas asas da mocidade. Tempere o gosto da idade Com amargura sem fim; Prove a paz de um querubim Tão puro de sentimentos, Depois brade aos quatro ventos: Poesia se faz assim!
Leia versos do sertão De Jó e Zezé Lulu, Manoel Filó e Xudu, De Louro e Sebastião, De Biu Crisanto e Cancão Que decantou o jasmim Cultivado no jardim Do autor da natureza, Então, fale com certeza: Poesia se faz assim!
Se espelhe no repentista Imortal Rogaciano, Em João Paraibano, Dedé Monteiro, um artista; Antônio Marinho na lista Dos mestres que não têm fim; Depois, igualmente a mim, Louve Pinto do Monteiro, Propagando ao mundo inteiro: Poesia se faz assim!
Os saudosos poetas repentistas Lourival Batista e Pinto do Monteiro, cantando em Caruaru, no ano de 1969
Pinto do Monteiro cantando com Lourival Batista:
Pinto do Monteiro Lourival você é mesmo Um bamba na cantoria Pois, tanto tem improviso Como tem muita teoria Porém para os companheiros Lhe falta ‘deplomacia’.
Lourival Batista
Você tem muita poesia Como em outro eu nunca vi Porém o seu português É fraco pelo que ouvi: Dizendo o ‘deplomacia’ Tire o ‘e’ e bote ‘i’.
Pinto do Monteiro
Troquei o ‘e’ pelo ‘i’ Fiz nas letras a mistura Mas o colega desculpe, Não é falta de cultura, Pois tudo isto acontece A quem não tem dentadura.
Lourival Batista
Lourival não lhe censura Por pronunciar assim Mas se é por falta de dentes Bote outros de marfim Pra não errar outra vez Que vier cantar ‘comim’.
Pinto do Monteiro
Agora eu achei ruim A frase do meu amigo Onde foi que você viu Comim em vez de comigo? Eu disse ‘deplomacia’ Mas uma dessas não digo.
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Dimas Batista
Deus vê do céu bem visíveis Nossos íntimos dilemas Pra Ele não tem problemas De soluções impossíveis Desde que são infalíveis Os atos do grande ser Todos têm que obedecer Rico, pobre, bom ou mau Não cai a folha de um pau Sem nosso Deus não querer.
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Manoel Filó
No sertão tem uma aranha De uma qualidade escassa Que tapa a sua morada Com lã da cor de fumaça O tecido é tão perfeito Que a chuva bate e não passa.
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Anjo Mendes do Condado
Da galinha eu gosto muito De certos pedaços dela Duas asas, duas coxas, Dois coxões e a titela, Pescoço com sobrebunda, Coração, figo e moela.
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Zé Catota
Na noite que eu nasci O diabo pisava em brasa A peitica no quintal Cantava e batia asas Passava um rasga mortalha Rasgando em cima da casa.
Na noite que eu nasci Na terra deu-se um abalo Ladrava cão no munturo Corria burro e cavalo E as galinhas no puleiro Cantavam mais do que galo.
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Zezo Correia Patriota
Canta a cauã com agouro Em cima de uma aroeira No ninho da quixabeira Canta a casaca-de-couro Eu admiro é um louro Lá no oco apertadinho Dentro criar um filhinho Com tanta satisfação Causando admiração A vida de um passarinho
Vê-se um maracanã Rasgando espiga de milho Pra dar comer a seu filho Todo dia de manhã Também vejo a ribaçã Pôr pelo chão sem ter ninho Deixar o ovo sozinho Depois tirar sem gorar Isso faz admirar A vida de um passarinho.
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Adauto Ferreira Lima
Quando o sujeito envelhece Quase tudo lhe embaraça Convida a mulher pra cama Agarra, beija e abraça Porém só faz duas coisas: Solta peido e acha graça.
Há diversos cantores do sertão que não têm sentimento nem receio de cantar nos salões serviço alheio, de Raimundo Pelado e Azulão, de Zé Duda ou Manuel do Riachão, maltratando os colegas com lamúrias. Descarrego em um destes minha fúria, porque sempre abomino o vitupério, eu só canto com homens de critério, pois cantar verso alheio é uma injúria.
Basta um cabra não ter disposição pra viver do serviço de alugado, pega numa viola e bota ao lado, compra logo o “Romance do Pavão”, a “Peleja do Diabo e Riachão” e a “História de Pedro Malazarte”. Sai no mundo a gabar-se em toda a parte e a berrar por vintém em mei da feira. Parasitas assim desta maneira é que têm relaxado a minha arte.
Inda existem diversos poetaços que, além de banais, são pervertidos, namoristas, gabolas, enxeridos, imprudentes, pedantes e devassos, que nas partes que andam, deixam traços comprovantes de infames impostores. Denuncio estes vis conquistadores, porque deles tornei-me adversário. Qualquer pai de família é necessário ter cuidado com certos cantadores.
Não faz nojo a catinga dos timbus, nem das feras carnívoras da mata, não faz nojo a matéria putrefata que alimenta os famintos urubus. Das hienas, chacais e caititus, nojo algum me provoca aquele cheiro. Os micróbios que há no mundo inteiro não me fazem ficar nauseabundo. Só o que me faz nojo neste mundo é a língua de um cabra fuxiqueiro.
Poetinha imoral, indecoroso, pra cantar não me chame, que eu não canto, se sentado ao meu lado, eu me levanto, não dou gosto a cantor escandaloso, porque todo indivíduo audacioso tem baixezas que a honra lhe consomem. Eu só canto com homem mesmo homem, cabra ruim não escuto dois minutos, que quem dá liberdade a certos brutos tá comendo no cocho que eles comem.
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Arimatéia Macêdo
Fui criado conhecendo a poesia, De cantadores repentistas nordestinos, Meu velho pai era um desses paladinos, Que versava com imensa maestria, Eles faziam rimas com enorme alegria, Neste instante eram muito ovacionados, Pelos versos que teriam recitados, Nas rezas, nos clubes, e até na gafieira, Apreciei alguns artistas consagrados, Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Conheci João Furiba e Zé Ferreira… Valdir Teles, Zé Cardoso e Gavião… Elomar, Antônio Ferreira e Azulão… Marcolino, Mestre Chico e João Bandeira… Sílvio Grangeiro, Ismael e Zé Pedreira… Pedro Bandeira e Vilanova renomados… Dos festivais têm saído premiados… Assim como Louro Branco e Quixabeira… Apreciei alguns artistas consagrados… Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Geraldo Amâncio, Marreco e Marcolino, Zé Batista, Daudeth e Chico Bandeira, Jomaci, Cravo Branco e Paulo Pereira, Zé Vicente, Zé Cardoso e Laurentino, Pinto do Monteiro, Sebastião e Clementino, Diniz Vitorino e Lourinaldo laureados, Otacílio e Lourival são diplomados, Oliveira de Panelas é de primeira, Apreciei alguns artistas consagrados, Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Conheci Jotão e Alexandre Ribeiro… Mouzinho, Lourenço e Antônio Lisboa… Sebastião, Fenelon e Arnaldo Pessoa… Antônio de França e Guriatã de Coqueiro… Zé Galdino e Miguelzinho Violeiro… Patativa era um dos mais celebrados… Os seus escritos foram muito bem gravados… Pude assistir a Rouxinol e a Lavandeira… Apreciei alguns artistas consagrados… Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
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Valdir de Lima
Lembrança não me faz medo Nem choro não me faz dó: Eu te mando sair daqui Te meto no xilindró… Se resmungar, leva peia! Se chorar leva cipó!
Eu pegando uma viola, Não sirvo de mangação: Sou que nem onça no inverno E cascavel no verão! Cantador metido a duro Me vem pedir a benção.
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Sebastião Cândido dos Santos
Já nasci assim Sou cabra valente Minha fama é na cantiga Sou feroz é no repente Colega, tome cuidado, Escute, fique ciente: Eu, pegando um cantador Sou pior que dor de dente!
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Cego Aderaldo
A tua cintura fina, De corpo de manequim Tem este formato assim, Porque fostes bailarina O esporte de grã-fina. Mas sem querer fazer troça, Com quem dança e canta bossa Eu afirmo sem temor, Se praticares amor, Em pouco tempo ela engrossa.
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Maurício Menezes
Procurei encontrar inspiração Num recanto de terra pequenina Pra fazer um poema em descrição Das histórias da vida nordestina Mas olhando para a força dessa gente Vi que um verso não é suficiente Pra mostrar a beleza do que vejo Um poema seria um disparate Não há verso no mundo que retrate A grandeza do povo sertanejo.
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Otacílio Batista
Eu nasci lá no velho Pajeú, São José do Egito é minha cidade Comecei com dezessete de idade, Imitando a voz do uirapuru. Nesta hora canto eu e cantas tu, Que a minha cantiga nada afeta É preciso ter uma ideia concreta Que o povo entenda o que é cantoria E se poeta vencer-me em poesia, Não direi a ninguém que fui poeta.
Meus versos inda são do tempo Que as coisas eram de graça: Pano medido por vara, Terra medida por braça, E um cabelo da barba Era uma letra na praça.
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Suspira Brasil! suspira! Tens razão de suspirar, Já vi-te rir no prazer, Hoje te vejo chorar, Qual uma barca sem norte, Vendo os vai-vem da sorte Esperando naufragar.
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Quando o velho Santo Jó Viu-se doente e leproso No Recife Alfeu Raposo Mandou-lhe uma fricção, A mulher dele mandou Pedir ao Dr. Tomé Na farmácia São José O Elixir da Salvação.
São Pedro era pescador Antes de seguir Jesus Quando o Dr. Santa Cruz Tomou conta de Monteiro Nero Imperador Romano Mandou um seu paladino Chamar António Silvino Para ser seu cangaceiro.
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Jânio Leite
Fui gerado e criado lá na roça Convivi toda infância com meus pais Não cursei faculdades federais Minha lição foi puxar burro em carroça Com a mão calejada e a pele grossa De um trabalho tão árduo e tão pesado Na enxada, na foice e no machado Meu alimento foi feijão e rapadura Calo seco é anel de formatura Pra quem fez faculdade no roçado.
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Natália Monteiro
Eu nasci num recanto diferente Onde a paz triunfante é quem comanda Mas se a chuva não vem ela desanda Da maneira que está ultimamente Mas meu sangue é de um povo persistente E ao invés de ficar desesperada Digo a Deus : Meu Senhor muito obrigada Tenho orgulho daqui deste meu chão Eu nasci nas caatingas do sertão Uma terra por deus abençoada.
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João Paraibano
Quando o dia começa a clarear Um cigano se benze e deixa o rancho A rolinha se coça num garrancho Convidando um parceiro pra voar Um bezerro cansado de mamar Deita o queixo por cima de uma mão A toalha do vento enxuga o chão Vagalume desliga a bateria Das carícias da noite nasce o dia Aquecendo os mocambos do sertão.
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Cego Aderaldo (No decorrer de uma visita ao Rio de Janeiro)
O clima do meu sertão É mais quente e mais sadio, Não é um clima abafado Como este clima do Rio. O sapo do Ceará, Vindo aqui morre de frio.
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João Firmino (Quando do falecimento do Cego Aderaldo)
Foi a forte aroeira que ruiu Ao contato do gume do machado. Foi o ferro melhor já fabricado Que o mercado do mundo jamais viu; Foi o trem, sem destino, que partiu, E ao longo da estrada deu o prego; Como Homero, também, ele era cego A quem todo o seu povo admirava… Para ser o próprio Homero só faltava Ao invés de cearense ser um grego!
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José Lucas de Barros (Em homenagem ao poeta repentista Diniz Vitorino Ferreira)
Nunca vi, em cantiga improvisada, um poeta maior do que Diniz, e acredito que Deus mandou chamá-lo por achar que este mísero país nunca soube entender o seu valor nem tampouco ajudá-lo a ser feliz!
Sem Diniz, a viola nordestina vai chorar, sem consolo, noite e dia; o poeta dos versos mais perfeitos se despede de nossa cantoria, mas no coro dos anjos, lá no céu, entra mais um maestro da poesia.
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Lino Pedra Azul
Meu povo, quando eu morrer Coloquem no meu caixão Meu uniforme de couro Meu guarda-peito e gibão Com um bonito retrato Do meu cavalo Alazão.
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Manoel Bentevi
Na vida ninguém confia Em nada sem ter certeza São obras da natureza Tudo que a terra cria: Gente, ave, bicharia, Tudo começou assim. O homem é quem é ruim Nada bom ele planeja Por muito forte que seja A morte pega e dá fim.
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Moacir Laurentino
Acho bonito o inverno Quando o rio está de nado Que o sapo faz oi aqui Outro oi do outro lado Parece dois cantadores Cantando mourão voltado.
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Um folheto de Apolônio Alves dos Santos
A MOÇA QUE SE CASOU 14 VEZES E CONTINUOU DONZELA
No outro século passado na fazenda Jequié havia uma donzela, religiosa de fé no seu batismo lhe deram o nome de Salomé
Salomé era uma virgem de estimada simpatia, filha de um fazendeiro criou-se muito sadia, era a moça mais formosa do estado da Bahia
Contava 22 anos aquela jovem tão bela sempre, sempre aparecia, namorado para ela casou-se 14 vezes e continuou donzela.
Um daqueles namorados, que Salomé arranjou, era um rapaz forte e moço em poucos dias casou, mas sua morte súbita todo mundo admirou.
Porque em menos dum ano que ele tinha casado, começou enfraquecendo pálido e desfigurado a noite deitou se vivo e amanheceu finado.
Olegário Mariano Carneiro da Cunha (Recife, Mar/1889 – Rio de Janeiro, Nov/1958)
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O PINTINHO CEGO – Olegário Mariano
É ridículo, não nego: Mas como me comovia Aquele pintinho cego Que eu criava e não me via.
O meu cuidado primeiro, Quando cansado chegava, Era indagar do caseiro Meu ceguinho como estava.
E ele que vivia a sós, Num momento aparecia. Certamente conhecia O timbre da minha voz.
Vinha vindo e tateando Pela grama do jardim. Abaixava-se piando A esperar com alegria A festa que eu lhe fazia Quando o tinha junto a mim.
Uma vez… (se bem me lembro Era o mês de dezembro) Pus a criadagem tonta… Ninguém dele dava conta.
Fiquei louco, furibundo, Pus em campo todo mundo, Gente corria assustada Pelo jardim, pela estrada,
Até que o acharam com frio, Longe, num campo baldio, Tonto, sem poder voltar. O seu caminho de volta Era escuro e misterioso Como uma noite sem luar.
Então resolvi prende-lo: Fiz-lhe uma casa de palha E a todo instante ia vê-lo. Desse modo procurava Dar-lhe paciência e esperança Enquanto ele era criança, Para aguardar o futuro Mais escuro que o esperava.
Mas o destino, na trama Como a aranha o prendeu.
O caseiro resolveu Soltá-lo um pouco na grama… E ele desapareceu.
Quando no fim de semana Voltei à minha choupana… Vinha feliz! Mal sabia Que ele não mais existia.
E me acreditem, não nego, Chorei com pena e saudade Daquele pintinho cego Que não via a claridade Do sol que ilumina o dia, Que dá vida a todos nós, E entanto me conhecia E era feliz quando ouvia O timbre da minha voz.
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RETRATOS DO PASSADO – Onildo Barbosa
Meu Sertão de minha vida Caminhos por onde andei Casa velha onde nasci Açudes que me banhei Estradas de chão batido Chapéu de couro curtido Lua cheia de verão Cheiro de curral de gado São retratos do um passado Na minha imaginação.
Caminhos tortos, riacho, Porteira aberta, vazante. Gravatá brotando cacho Um sol se pondo distante, Rastros de pássaros na areia, Sorriso de lua cheia, Cantiga de Azulão, Um rouxinol no telhado São retratos do passado Na minha imaginação.
CARTA A PAPAI NOÉ – Luís Campos Seu moço eu fui um garoto Infeliz na minha infância Que soube que fui criança Mas pela boca dos outo. Só brinquei com os gafanhoto Que achava nos tabuleiro Debaixo dos juazeiro Com minhas vaca de osso Essa catrevage, sêo moço Que a gente arranja sem dinheiro. Quando eu via um gurizin Brincando de velocipe De caminhão e de gipe Bola, revólver e carrin Sentia dentro de mim Desgosto que dava medo Ficava chupando o dedo Chorando o resto do dia Só pruquê eu num pudia Pegar naqueles brinquedo. Mas preguntei uma vez A uns fio de dotô Diga, fazendo um favô Quem dá isso pra vocês? Mim respondeu logo uns três Isso aqui é os presente Que a gente é inocente Vai drumí às vêis nem nota Aí Papai Noé bota Perto do berço da gente. Fiquei naquilo pensando Inté o Natá chegá E na Noite de Natá Eu fui drumi mim lembrando Acordei fiquei caçando Por onde eu tava deitado Seu moço eu fui enganado Que de presente o que tinha Era de mijo uma pocinha Que eu mermo tinha botado Saí c’a bixiga preta Caçando os amigos meu Quando eles mostraram a eu Caminhão, carro e carreta Bola, revólver, corneta E trem elétrico, até Boneca, máquina de pé Mas num brinquei, só fiz vê E resolvi escrevê Uma carta a Papai Noé.
DEZ MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO SOBRE GETÚLIO VARGAS
Francisco Maia de Queiroz, o popular Louro Branco, poeta, repentista e compositor
Louro Branco
Amo meus pais como prova Porque são meus genitores Mamãe na cova sem dores Papai com dores sem cova Mamãe morreu muito nova Papai ficou sem aquela Hoje a casa dele e dela Não é dela e nem é dele Mamãe na cova sem ele Papai na casa sem ela.
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Maria Rafael dos Anjos Ferreira (Rafelzinha)
Quem quiser sentir saudade Faça do jeito que eu fiz Deixe seu torrão natal Sem querer como eu não quis Saia por necessidade Que depois você me diz
Para fazer como eu fiz Não precisa ter coragem Depende da precisão Fazer de tudo embalagem Se subir num caminhão Chorar durante a viagem
Foi de cortar coração Na hora da despedida Saí de onde nasci Pra terra desconhecida Por contraste a incerteza De arrumar o pão da vida
Foi na hora da partida Quem assistiu lamentava Era bem de tardezinha Uma chuva se formava Para o lado do nascente Ai era que eu chorava.
Quanto mais longe eu ficava Mais a saudade crescia Olhava tanto pra trás Que o pescoço me doía Pra ver se ainda avistava A casa que eu residia
Era tão grande o meu pranto Que Joãozinho se comovia De vez em quando eu olhava Me ajeitava, me pedia Lelê não chore tanto Nós vamos voltar um dia.
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Espedito de Mocinha
Eu nasci e me criei Aqui nesse pé de serra Sou filho nato da terra Daqui nunca me ausentei Estudei não me formei Porque meu pai não podia Jesus filho de Maria De mim se compadeceu E como presente me deu Um crânio com poesia.
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Zé Limeira
Minha muié chama Bela Quando eu vou chegando em casa O galo canta na brasa, Cai o texto da panela Eu fico olhando para ela Cheio de contentamento O satanás num jumento Pra mordê a Mãe de Deus Não mordeu ela nem eus Diz o novo testamento.
Eu vi uma gavetinha Da casa de João Moisés Mais de cem contos de réis Só de ovo de galinha Ela comeu uma tinha Da carcaça de um jumento Que bicho má, peçonhento Lacrau e piôi de cobra Não pode mais fazer obra, Diz o novo testamento.
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Chico Alves
A ema tem ligeireza Seja no claro ou na luz Possui asas mas não voa É parente de avestruz E pesa setecentos gramas O ovo que ela produz.
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Inácio da Catingueira
Tenho pena de deixar A Serra da Catingueira A Fazenda Bela Vista A maior dessa ribeira O Riacho do Poção, As quebradas do Teixeira.
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João Paraibano
Poesia uma das flores Que só Deus beija a corola Joia que a mão não segura Se aprende sem escola Imagem que a gente amarra Com dez cordas de viola.
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Valdir Teles
Minha mulher já brigou Com minha própria cunhada, Chamou a irmã safada Porque me cumprimentou. Inda ontem perguntou Por que é que essa cadela, Só vem na minha janela Quando você se apresenta? Eita mulher ciumenta Essa que casei com ela!
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Lourival Batista
Sua vida inda está boa A minha é que está ruim Que você tá no começo, Eu já tô perto do fim; Tô perto de ficar longe De quem tá perto de mim.
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Assis Coimbra
Eu vou mandar construir Cadeia para corrupto, Pois pra mim é um insulto Essa laia progredir. E de lá só vão sair Para o “roubo” devolver. Depois eu torno prender, Esse bando de safado, Que muito já tem roubado, Faça igual que eu quero ver.
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Um folheto de Rodolfo Coelho Cavalcante
A CHEGADA DE GETULIO VARGAS NO CÉU PARA JULGAMENTO
Quando Getúlio morreu O manto da natureza Tingiu-se todo de luto Mostrando maior tristeza Soluçando pelo astro Que brilhou com mais grandeza.
De manhã o sol não quis Demonstrar o seu fulgor O mar sereno gemia Num espetáculo de dor E a lua no espaço Perdeu toda a sua cor.
Os homens aqui da Terra Perderam suas razões Em desespero gritavam Como se fossem leões Pela perda de seu líder Amado pelas nações.
DOZE MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO DE GRACEJOS
O saudoso Poeta Manoel Filó
Manoel Filó
Eu acho que não convém Falar de quem bebe porre Porque se quem bebe morre Sem beber morre também Apenas quem bebe tem Suas artérias normais Trata das fossas nasais Controla o metabolismo Cachaça no organismo É necessário demais.
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Por muito prazer que a gente Na vida já tenha tido Só presta o que está na frente O que passou, tá perdido.
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Louro Branco
Admiro a Natureza Mar vomitando salinas Lajedos de corpos nus Com as pedras cristalinas E as serras, túmulos rochosos Onde Deus sepulta as minas.
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Lenelson Piancó
Eu admiro a formiga Que tem problema de vista Andando no ziguezague Sem carta de motorista Não se atrasa no trabalho Nem congestiona a pista.
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Luiz Campos
Eu nasci numa tapera Que foi herança de pai. A chuva lá vem não vem A casa tá vai não vai, Todo dia eu boto barro Toda noite o barro cai.
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Hélio Crisanto
Quando ouço o cantar da seriema Se coçando na trave da cancela Juriti voando perto dela Parecendo uma tela de cinema; Uma cobra no ninho bebe a gema A cigarra completa a melodia Uma cabra deitada dando cria Um cavalo deitado joga crina Quando o sol, de manhã, rasga a cortina O sertão se desmancha em poesia.
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Geraldo Amâncio
O mundo se encontra bastante avançado A ciência alcança progresso sem soma Na grande pesquisa que fez do genoma Todo o corpo humano já foi mapeado No mapeamento foi tudo contado Oitenta mil genes se podem contar A ciência faz chover e molhar Faz clone de ovelha, faz cópia completa Duvido a ciência fazer um poeta Cantando galope na beira do mar.
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Otacílio Batista
No romper da madrugada, um vento manso desliza, mais tarde ao sopro da brisa, sai voando a passarada. Uma tocha avermelhada aparece lentamente, na janela do nascente, saudando o romper da aurora, no sertão que a gente mora mora o coração da gente.
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O cantador violeiro longe da terra querida, sente um vazio na vida, tornando prisioneiro, olha o pinho companheiro, aí começa a tocar, tem vontade de cantar, mas lhe falta inspiração. Que a saudade do sertão faz o poeta chorar.
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João Paraibano
Terreno ruim não dá fruto, Por mais que a gente cultive, No seu céu eu nunca fui, Sua estrela eu nunca tive, Que o espinho não se hospeda, Na mansão que a rosa vive.
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Rogério Menezes
Quando a mulher é jogada Na mais detestável lama, Recebendo humilhações Da pessoa que mais ama, A Terra bebe chorando As lágrimas que ela derrama
GRANDES MOTES, GRANDES GLOSAS E UM FOLHETO BEM ATUAL
O grande Poeta tabirense Dedé Monteiro
Dedé Monteiro glosando o mote:
Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
(Glosas feitas em 2002, quando da greve dos professores)
Sete fevereiros faz, Segundo informes tranquilos, Que um bujão de treze quilos Custava uns sete reais. Hoje, é vinte e dois ou mais. Houve ou não houve inflação? Faça a pergunta ao fogão Que ele diz quanto por cento… Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
Na bandalheira infernal Do cenário que eu contemplo, O gás é só um exemplo, Pois o desmando é geral. De barato, além de sal, Só tem: desculpa, perdão, Conselho, aperto de mão, Descaso e constrangimento. Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
Aumento sempre acontece. Sobe tudo todo dia. O monstro da carestia Frequentemente aparece. Só tem algo que não cresce, Permanece eterno anão: O salário que nos dão No dia do pagamento… Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
O “chefe” mandou dizer Em tom de “benevolência”: “Mestres, tenham paciência Que, em março, eu vou resolver…” Ah coisa ruim de fazer, Essa conta do patrão!… Se for multiplicação, Diminui nosso tormento. Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
Não adianta ameaça Como a que fez no domingo… Isso não resolve um pingo. Se quer fazer mais que faça. Galo é quem canta de graça, Basta ter milho no chão. Respeite a educação, Mostre que tem sentimento. Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
Não vá dizer que a escola É prioridade sua, Se o professor continua Recebendo a mesma esmola, Esmola que descontrola O motor da vocação, Porque, sem manutenção, Motor não faz movimento. Sete anos sem aumento Não é brincadeira não.
Sete anos de pobreza Desencanta o professor, Sete anos de “terror” Destrói qualquer fortaleza, Sete anos de incerteza Enfraquece a profissão, Sete anos de opressão Multiplica o sofrimento, Sete anos sem aumento É brincadeira do cão!…
* * *
Severino Ferreira da Silva glosando o mote:
Os meus sonhos de poeta Já foram realizados.
De porta veneziana Eu não tenho moradia Pra passar meu dia-a-dia Tenho apenas a choupana Uma garrafa de cana E uns cadernos borrados Dois troféus enferrujados Na coleção incompleta Os meus sonhos de poeta Já foram realizados.
A viola companheira Que me ajuda todo dia Eu viver de poesia Adquirir minha feira Tem quem ache uma besteira Meus improvisos rimados Meus versos filosofados Bem pouca gente interpreta Os meus sonhos de poeta Já foram realizados.
* * *
Asa Branca do Ceará glosando o mote:
Com a força das orações Zé Vicente se levanta.
Precisamos nos unir Numa corrente de prece Que Jesus nos favorece Não vai nos deixar cair Virá pra nos assistir Nessa hora pura e santa Com sua mão sacrossanta Nos livra das aflições Com a força das orações Zé Vicente se levanta.
Bendito é o que confia Em Deus pai Deus verdadeiro Nosso divino cordeiro Jesus filho de Maria Que na hora da agonia Quase sem voz na garganta Com sua bondade santa Perdoava as multidões Com a força das orações Zé Vicente se levanta.
* * * Asa Branca do Ceará glosando o mote:
No fim da minha existência.
Ó mundo de ilusão O qual não posso mais ver Devido a escuridão Que pairou no meu viver Minhas noites são eternas Escuras como cavernas Da mais terrível aparência Meus olhos se opacseram O brilho imenso se perderam No fim da minha existência.
Quando Deus reto juiz Chamar-me à eternidade Atenderei bem feliz A ordem da divindade A vida é um episodio Que deve se dar sem ódio Sem dúvida e sem mau carência Quando eu estiver na cova A cruz servira de prova Do fim da minha existência.
POETAS DO PASSADO E UM FOLHETO DE DISCUSSÃO SOBRE CIGARRO E BEBIDA
Ivanildo Vila Nova e Valdir Teles recordando os poetas do passado:
* * *
Um folheto de Severino Borges da Silva
DISCUSSÃO DE JOÃO FORMIGA COM FRANCISCO PARAFUSO
Estava João Formiga Versejando alegremente Nas terras do Ceará Quando chegou de repente Um cantor do Mato Grosso Quase tonto de aguardente
Chegou na sala e saudou A todo o povo primeiro E disse a João Formiga: — Vá sabendo cavalheiro Sou Francisco Parafuso Dou certo em todo tempero
O dono da casa disse: — Pois então, meu camarada Você canta com Formiga Uma discussão pesada Se ganhar leva o dinheiro Se perder não leva nada
— Porém eu vou dar um tema Com estilos naturais Para Formiga dizer Com bases fundamentais Sem errar nem dar um tombo Nem bebo, nem fumo mais
E parafuso responde Para se ouvir e ver Defendendo a aguardente Durante enquanto viver E dizer no fim do verso Bebo e fumo até morrer
Formiga
Meu amigo Parafuso Agora vou lhe dizer Deus me livre de beber Fumar eu também não uso Do fumo eu tomei abuso Porque nada bom não traz Pois quando eu era rapaz Quase o fumo me liquida Enquanto Deus der-me vida Nem bebo, nem fumo mais
Parafuso
Você é um inocente Fumar é uma beleza O fumo tira a tristeza Fica a pessoa contente O suco da aguardente Ao homem dá bom prazer Portanto posso dizer Com pensamento profundo Enquanto eu viver no mundo Bebo e fumo até morrer
GRANDES MOTES, GRANDES GLOSAS E UM FOLHETO DE CANGAÇO
O genial cantador repentista paraibano Pinto do Monteiro (1896-1991)
Pinto do Monteiro glosando o mote:
Comi na casa de Pinto Galinha com rapadura.
Cheguei numa ocasião Que procurei, mas não tinha Nem xerém e nem farinha, Nem arroz nem macarrão, Fubá, bolacha nem pão, Nem salada de verdura, Por não ter outra mistura, Eu que vinha tão faminto, Comi na casa de Pinto Galinha com rapadura.
* * *
Pinto do Monteiro glosando o mote:
Na grandeza do Amazonas Encontrei meu grande amor.
O pobre do seringueiro Tem o índio por vigia, O macaco por espia, E o tigre por companheiro! A bem de ganhar dinheiro, Trabalha seja onde for. Mas eu fui foi ver a flor Que habita àquelas zonas! Na grandeza do Amazonas, Encontrei meu grande amor.
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Moisés Sesiom glosando o mote:
Dá sapato e dá gibão Toda obra o couro dá.
Dá manta, bota e silhão, Dá chapéu, dá bandoleira, Dá carona e dá perneira, Dá sapato e dá gibão. Pra se fazer matulão O couro é como não há, Serve até pra caçuá, Dá peia, da rabichola, Se prendendo a couro ou sola, Toda obra o couro dá.
* * *
Ivanildo Vilanova glosando o mote:
Quem maltrata um inocente Não tem Deus no coração.
Devia ser fuzilado Quem usa punho ou chibata Ou qualquer um que maltrata O menor abandonado Mesmo sendo batizado Para mim não é cristão Quem bate com cinturão Tem o demônio na mente Quem maltrata um inocente Não tem Deus no coração.
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Cícero Moraes e Lima Júnior glosando o mote:
A morada de Deus é tão distante Que é preciso morrer pra chegar nela.
Cícero Moraes
Todos nós já nascemos com missão A cumprir quando em vida aqui na terra No momento em que a vida se encerra Nós cumprimos a determinação E o chamado de Deus para a mansão Vem às vezes de uma forma singela Quando a alma se solta e o corpo gela A viagem ao céu é no instante A morada de Deus é tão distante Que é preciso morrer pra chegar nela.
Lima Júnior
O relógio da vida marca a hora Reservada pra última viagem Sem comprar um bilhete de passagem Nem saber o momento de ir embora Perde a vista quem vai, quem fica chora Quando a terra nos abre uma janela O espírito se solta o corpo gela E o caixão é o transporte mais possante A morada de Deus é tão distante Que é preciso morrer pra chegar nela
Cícero Moraes
Se perder um amigo faz pesar, Imagine um filhinho ou um irmão É capaz de parar o coração, Não existe quem possa amenizar Tanta dor e tristeza no olhar No momento de uma sentinela E lembrando essa pessoa bela A saudade se torna agonizante A morada de Deus é tão distante Que é preciso morrer pra chegar nela.
Lima Júnior
A matéria cansada não atende Aos comandos da mente que se cansa A pressão sobe e desce igual balança Quando encurta a passada e o corpo pende Sem a força vital não compreende Vendo um anjo fazendo sentinela Vem um sopro da morte apaga a vela E a Deus manda mais um ser errante A morada de Deus é tão distante Que é preciso morrer pra chegar nela.
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Miguel Leonardo glosando o mote:
São os sons que ninguém pode esquecer Se já foi residente no sertão.
Ainda sinto bem forte em meu ouvido O martelo tinindo do ferreiro, O cantar do rei galo no poleiro E o jegue rinchando co’alarido. Foguetório gerando um estampido Numa noite animada de São João, Passarinhos fazendo saudação No horário do dia amanhecer, São os sons que ninguém pode esquecer Se já foi residente no sertão.
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Carlos Severiano Cavalcanti glosando o mote:
Eu plantei em janeiro o meu roçado, mas a chuva faltou, fiquei sem nada.
Fui ao silo e tirei toda a semente que restava guardada há mais de um ano e saí a plantar em solo plano na esperança de inverno consistente. O trovão ribombou e de repente envolvi-me no som da trovoada. O riacho rosnando na enxurrada, o meu milho pouquinho semeado. Eu plantei em janeiro o meu roçado, mas a chuva faltou, fiquei sem nada.
Trinta dias depois da plantação eu gostava de ver meu milharal verdejante, brilhando, colossal, alegrando meu frágil coração. Fiz a limpa primeira na intenção de arrancar todo o mato usando a enxada, começava a limpar de madrugada sem contudo sentir-me mais cansado. Eu plantei em janeiro o meu roçado, mas a chuva faltou, fiquei sem nada.
DOIS POEMAS DE PATIVA DO ASSARÉ E UM FOLHETO SOBRE EDUCAÇÃO
Patativa do Assaré (Mar/1909 – Jul/2002)
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TRÊS MOÇA (Paródia do poema “Fulô de Puxinanã” do renomado poeta Zé da Luz)
Três moça, três atração, Três anjo andando na terra, Eu vi lá no pé da serra Numa noite de São João.
A premêra era a Benvinda E eu juro pro Jesus Cristo Como eu nunca tinha visto Uma coisinha tão linda.
Benvinda, o premêro anjo Tinha a voz harmoniosa Como as corda sonorosa Do bandulim dos arcanjo.
A segunda, a Felisbela, Era um mundo de beleza, Não sei como a Natureza Acertou pra fazê ela.
Os óio era dois primô Com tanta quilaridade Como quem sente sodade De um bem que nunca vortô
A terceira ,a Conceição, Era a mais nova das três Parecia santa Inês Quando sai na procissão.
Nunca houve sobre a terra E não pode havê ainda Quem diga qual a mais linda Das moça do pé da Serra.
Se arguém mandasse jurgá E a mais bonita iscuiê Eu ficava sem sabê, Pois todas três era iguá.
Quando oiei pras três menina Oiei tornei a oiá, Eu fiquei a maginá Nas coisa santa e divina.
E o que ninguém desejô Desejei naquela hora Sê o grande Rei da Gulora O Divino Criadô.
Mode agarrá as três donzelas, Invorvê num santo véu E levá viva pro céu Pra ninguém mexê com elas.
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AS PROEZAS DE SABINA
Derne o Sú até o Norte O mundo cria de tudo, Cabra fraco e cabra forte, Um alegre, outro sizudo. Diz o professo Raimundo Que este nosso veio mundo De tudo pissui com sobra, Coisa bela e coisa feia, Home do geno de uvêia, Muié do geno de cobra.
A vida não vale nada, Tudo veve a peleja E o mundo é uma charada Custosa de decifra. Mas, como quarqué sujeito Qué tê razão e dereito, Dá notiça e discrimina As coisa deste universo, Eu vou conta nestes verso As proeza de Sabina.
Sabina é muié dereita, Munta honestidade tem, Não apoia nem aceita Brincadêra com ninguém. E dessas muié valente, Atrevida e renitente, Que, quando pega a falá, Nem o Satanás resiste. E ainda hoje ela insiste Neste Brasi de Cabrá.
Ela nasceu num pranêta Afobado e revortado, Não se assombra com careta Nem tem medo de barbado. Pensando nesta senhora, Vem logo em minha mimora O que diz certo canto Nos seus verso nordestino: “Paraíba masculino, Muié macho, sim sinhô!
Poeta popular Diniz Vitorino (1940-2010) – Foto do colunista fubânico Cardeal Paulo Carvalho
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A PRÓXIMA VIAGEM – Diniz Vitorino
Aonde irei? Qual será o novo porto Que terei para minhas aventuras? Os abismos profundos do mar morto Ou as rubras galáxias das alturas?
O meu destino eu não sei, sei que, absorto Rogo a Deus que perdoe minhas loucuras E, com os dedos em riste, indique o horto Para minhas passadas inseguras
Seja ele como for subi-lo-ei Se garranchos houver, os pisarei Mesmo abrindo nos pés profundas chagas
Vendo o sangue cair das faces lívidas Me proponho a quitar todas as dívidas Que na terra por mim não foram pagas.
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O PEIXE – Patativa do Assaré
Tendo por berço o lago cristalino, Folga o peixe, a nadar todo inocente, Medo ou receio do porvir não sente, Pois vive incauto do fatal destino.
Se na ponta de um fio longo e fino A isca avista, ferra-a inconsciente, Ficando o pobre peixe de repente, Preso ao anzol do pescador ladino.
O camponês, também, do nosso Estado, Ante a campanha eleitoral, coitado! Daquele peixe tem a mesma sorte.
Antes do pleito, festa, riso e gosto, Depois do pleito, imposto e mais imposto. Pobre matuto do sertão do Norte!
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MORRIA O SOL NO OCASO – Otacílio de Azevedo
Morria o sol no ocaso e o olhar de minha amada qual rubro sol distante, a rutilar, morria… Gemia o seu soluço errando pela estrada e errando pela estrada eu, mísero, gemia!
Perdia o sol tombando, a clara luz doirada e o vulto dela, ao longe, aos poucos, se perdia. Fugia o meu olhar no curso da jornada e o seu magoado olhar tristíssimo fugia…
O sol tombou no poente em nuvens de oiro e arminho, e Cleonice, chorando, à curva do meu caminho, entre as sombras da noite, exânime tombou…
Entanto, o mesmo sol que desmaiara outrora, vem todas as manhãs ao despontar da aurora, só ela, nunca mais, oh! nunca mais voltou!
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MEU AMIGO POETA – Noé de Job Patriota
Meu amigo poeta meu irmão Companheiro de farra em toda mesa Nossa alma poética vive acessa Com a luz da divina inspiração
Faça um verso repleto de ilusão Que a ilusão do poema é mensageira Que um poeta que canta a vida inteira Guarda dádivas de amor no coração
Numa mesa de bar fica bebendo E assim sempre o passado revivendo Se embriaga com goles de emoção
Peregrino das noites inquietas Andarilho das sendas incompletas Navegante dos mares da paixão.
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DIVERGÊNCIA – Manoel Filó
Seja grosseira, me responda aos gritos Encha de mágoa o meu interior Seus seios virgens, quentes e bonitos Também tiveram culpa em minha dor.
Sem machucar os corações aflitos Deve ser muito bom morrer de amor Seus olhos mostram dois aerólitos Enfeitando o espaço ao sol se pôr.
Já que não posso merecer seu porte Fico parado condenado a sorte Que não nos trouxe condições iguais.
Eu não sou cofre de guardar segredo Ou tive culpa de nascer mais cedo Ou foi você que demorou demais.
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DESARMAI VOSSOS FILHOS – Pompílio Diniz
Desarmai vossos filhos pequeninos Para depois não vê-los transformados Em párias marginais e celerados Cruéis e perigosos assassinos!
Lembrai-vos de que foram tais meninos Tão cedo, seus instintos despertados Por armas e brinquedos simulados De “mocinhos”, “bandidos” e traquinos!
Desarmai vossos filhos, desarmai-os Para depois não tê-los nos ensaios Da delinquência e do ódio prematuro!
Não dei aos vossos filhos tais presentes Esses brinquedos de armas são sementes De crimes que plantais para o futuro!
A VERDADEIRA HISTÓRIA DA VIDA AVENTUROSA DO EMBARGO INFRINGENTE – Rochinha das Queimadas (o Gavião Cantador)
O menino Infringentinho Era um menino indecente, Roubava prata de cego E remédio de doente, Mentia com segurança E ria trincando os dentes, Nunca sabia de nada, Se fazia de inocente.
Depois que ficou rapaz, Infringente se perdeu, Tomava muita cachaça E até adoeceu, Queria uma profissão E ao diabo se vendeu, Fez acordo com o capeta, Deputado se elegeu.
Se deu muito bem na vida E logo enriqueceu, Das aventuras passadas, Ele nunca se esqueceu, Mas roubava com cuidado, Nunca ninguém percebeu, E o seu maior amigo Se chamava Zé Bedeu.
Não era muito estudado, Mas era inteligente, Toda vez que apertado, Saía pela tangente, Por artimanhas ganhou Um nome proeminente, Um nome largo e pomposo: É o Embargo Infringente.
Com Embargo ninguém pode, De tudo ele é capaz, Tudo que o diabo manda, Muito ligeiro ele faz, Nunca perde uma peleja E não vai perder jamais, Ele é invencível mesmo Falando nos tribunais.
Doutor, Embargo Infringente É um pau pra toda obra, Ele faz qualquer serviço, Mas por tudo ele cobra, O cara fica com tanto, Ele fica com a sobra, Tudo vai acumulando, Sua fortuna redobra.
O Brasil tá dominado, Mas não tem tristeza, não; A vida melhor do mundo É a vida de ladrão, Pode roubar sossegado, Passear de avião, Pois o Embargo Infringente Lhe segura com a mão.
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Rochinha das Queimadas (o Gavião Cantador) glosando o mote:
Eu sou o embargo infringente Que ajudou Zé Dirceu.
Sou veneno estricnina, Vidro moído com breu, Sou Zé Pilintra de fogo, Sou um sacerdote ateu, Sou catapora e sarampo, Sou o próprio Zebedeu: Eu sou o embargo infringente Que ajudou Zé Dirceu.
Sou o safado famoso Que no lodaçal cresceu, O bandido façanhudo Que à justiça venceu, Sou o pai dos salafrários, Coice que o jumento deu: Eu sou o embargo infringente Que ajudou Zé Dirceu.
Sou urso pé de veludo Que escondido comeu, Engabelando os otários, A grande pança encheu, E foi muito engraçado, Quase ninguém entendeu: Eu sou o embargo infringente Que ajudou Zé Dirceu.
Sou bicho de sete capas, Nunca ninguém me venceu, Quando atiro é morte certa, Quem duvidou se fodeu, Eu dou as cartas de cima, Quem apostar já perdeu: Eu sou o embargo infringente Que ajudou Zé Dirceu.
Rolando Boldrin declamando o poema “A Revolta dos Macacos“, de Pompílio Diniz:
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Rolando Boldrin declamando o poema “Pru Quê“, de Pompílio Diniz:
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O JÚRI – Pompílio Diniz
Num há, no mundo, home mole Dêsse ditado num isqueça: “Quem cum muntas peda bole Uma lhe quebra a cabeça!” “Boa rumaria faz Quem em casa fica im paz” Pra qui nada lhe aconteça…
Veja bem: im Conceição, Havia um cabra valente Qui tinha pur profissão Bate im cara de gente Brigava cum cinco ou seis Cum ele num tinha vez Nem respeitava ambiente!
Zé de Soiza, onde chegava, O povo todo curria Delegado se trancava E a puliça se iscondia Inté os Santo do artá Quando via ele passa Fechando o zói se binzia
Ao contráro desse home, Tombem tinha em Cunceição O cabôco Zé Girome Vagaroso e moleirão… Pois arrepare Dotô: Foi Girome quem matô Zé de Soiza, o valentão
Francisco Maia de Queiroz, o popular Louro Branco, poeta repentista cearense
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Francisco Maia de Queiroz (Louro Branco)
O CASAMENTO DOS VELHOS
Tem certas coisas no mundo Que eu morro e num acredito Mas essa eu conto de certo Dum casamento bonito De um viúvo e uma viúva Bodoquinha Papaúva E Tributino Sibito
O véio de oitenta ano Virado num estopô A véia setenta e nove Maluca por um amor Os dois atrás de esquentar Começaram a namorar Porque um doido ajeitou
Um dia o véio comprou Um corpete pra bodoquinha Quando a véia foi vestir Nem deu certo, coitadinha De raiva quase se lasca Que o corpete tinha as casca Mas os miolo num tinha
No dia três de abril Vêi o tocador Zé Bento Mataram trinta preá Selaram oitenta jumento Tributino e Bodoquinha Sairam de manhazinha Pra cuidar do casamento
O veião saiu vexado Foi se arranchar na cidade Mandaram chamar depressa Naquela oportunidade O veião chegou de choto Inda deu catorze arroto Que quase embebeda o padre
O padre ai perguntô: Seu Tributino, o que pensa, Quer receber Bodoquinha Sua esposa, pela crença? O veião dixe: eu aceito Tô tão vexado dum jeito Chega tô sem paciência
E preguntô a Bodoquinha: Se aceitar esclareça A véia lhe arrespondeu Dando um jeitim na cabeça Aceito de coração Tô cum tanta precisão Tô doida que já anoiteça
Casaram, foram pra casa Comeram de fazer medo Conversaram duas horas Uns assuntos duns segredo E Bodoquinha dixe: agora, Meu pessoá, vão embora Que eu quero drumi mais cedo
O véi vestiu um pijama Ficou vê uma raposa A véia de camisola Dixe: óia aqui sua esposa Cuma é, vai ou num vai? O veião dixe: ai, ai, ai Já tá me dando umas coisa
A véia dixe me arroche Cuma se novo nóis fosse O véio dixe: ê minha véia Acabou-se o que era doce A véia dixe: é assim? Então se vai dar certim Que aqui também apagou-se
Inda tomaram uns remédio Mas num deu jeito ao enguiço De noite a véia dizia: Mas meu véi, que diabo é isso? Vamo vendê essa cama Nóis sempre demo na lama Ninguém precisa mais disso
A véia dixe: isso é triste Mas esse assunto eu esbarro Eu já bati o motor Meu véi estrompou o carro Ê, meu veião Tributino Nóis dois só tem um menino Se a gente fizer de barro.
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Patativa do Assaré
AS PROEZAS DE SABINA
Derne o Sú até o Norte O mundo cria de tudo, Cabra fraco e cabra forte, Um alegre, outro sizudo. Diz o professo Raimundo Que este nosso veio mundo De tudo pissui com sobra, Coisa bela e coisa feia, Home do geno de uvêia, Muié do geno de cobra.
A vida não vale nada, Tudo veve a peleja E o mundo é uma charada Custosa de decifra. Mas, como quarqué sujeito Qué tê razão e dereito, Dá notiça e discrimina As coisa deste universo, Eu vou conta nestes verso As proeza de Sabina.
Sabina é muié dereita, Munta honestidade tem, Não apoia nem aceita Brincadêra com ninguém. E dessas muié valente, Atrevida e renitente, Que, quando pega a falá, Nem o Satanás resiste. E ainda hoje ela insiste Neste Brasi de Cabrá.
UMA DUPLA EM CANTORIA, DOIS POEMAS E UM FOLHETO ATUALÍSSIMO
Valdir Teles e Zé Viola improvisando com o tema “O boi amarrado no pé da cajarana“:
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SECA PARA QUEM? – Simone Passos
Um país onde cada Comissão (De Direitos Humanos, de Justiça…) É corrupta, inerte e omissa, Quem preside é racista ou é ladrão; Um país que não olha pra o sertão, A não ser que precise dele um dia; Que é covarde e só faz demagogia, Como pode mudar o seu destino Se só mente a esse povo nordestino E ignora o que é cidadania?
A indústria da seca é lucrativa Gera renda aos que investem nela, Reduzindo o sertão à bagatela De uma terra sem vida, improdutiva, Onde só o governo é quem cultiva As sementes da alienação Pra colher os seus frutos na eleição, Iludindo e enganando o inocente E depois humilhar toda essa gente Esquecendo essa gente e o sertão!
Sertanejo também tem sede e fome Não somente de água, leite ou pão Tem a fome de ser um cidadão De não ser indigente, ter um nome É sedento da força que não some Numa luta de um povo que não cansa, Sertanejo tem fé, perseverança Pra enfrentar um governo surdo e mudo Ante um povo que tem fome de tudo, Mas que só se alimenta de esperança!
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NA TRISTE NOITE DA CORRUPÇÃO – Merlânio Maia
Eis a nação que sonha embevecida Ser um exemplo aos povos do futuro E agora acorda em seu triste monturo Que foi forjado ao longo de sua vida Desde o império se inclina em descida Com sanguessugas que sugando vão Multiplicando sujeira em seu chão Frente ao pomposo poder do império Incomodando heróis no cemitério Na triste noite da corrupção!
Seus mortos, hoje, tão desesperados Saem às ruas, levantam bandeiras, Dançam nas praças, alamedas, feiras… Profundamente decepcionados De Tiradentes escuta-se os brados De Castro Alves a indignação Voltam os poetas da libertação Junto aos heróis, do além, republicanos, Dançam nas noites contra os tais tiranos Na triste noite da corrupção!
Se o tempo urge, a tal nação se arrasta… Só vendo seu pobre povo humilhado, Presenciando o roubo deste estado Que, a cada dia, da riqueza afasta. – Aos miseráveis, pão com circo basta! E a liberdade escorre pela mão E num crescendo se esparrama ao chão No gesto tosco desse vai e vem Só sonhadores gritam do além Na triste noite da corrupção!
Os pigmeus da moral querem trono Mesmo levando o país ao abismo Ninguém vê honra, lisura, altruísmo!… Brasil delira feito um cão sem dono Em berço esplêndido o gigante é sono, Enferrujado na acomodação A idiotice contamina o chão O povo dorme e o vazio é extenso, Os mortos gritam vendo o mal imenso Na triste noite da corrupção!
A hipocrisia é corrente moeda E a mentira agora é um ideal A mídia cria a tal versão final E o fato perde a força e leva queda Quem mente mais do poder não se arreda A lama envolve e a TV faz serão, Faz a cabeça – dona da razão! E o povo teme e tremendo obedece. Há uma teia que a aranha tece Na triste noite da corrupção!
Brasil desperta, apresenta a imponência! Acorda e grita: Independência ou morte! Colosso impávido, de infinito porte, Mostra a lisura da tua inocência Chama os teus filhos plenos de decência Expulsa o mentiroso e o ladrão Levanta o braço de enorme nação Que vibra dentro do teu forte povo Faz teus heróis renascerem de novo Na triste noite da corrupção!
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Um folheto de Jotacê Freitas
CORDEL PARA A PRESIDENTA DE UM PROFESSOR AFLITO
Excelentíssima Dilma Presidenta do Brasil Leia este desabafo De um cidadão servil Que elegeu a senhora Por ter crido no que viu.
Vi que sua bela história Não ocorreu por acaso Sua missão era esta Acabar com o atraso Pois com a mulher por cima Crescimento não tem prazo.
Não sei se a mosca azul Que picou o nosso Lula Ou os tais acordos tácitos Que a muita gente embrulha Mudou nossa governanta Que aos políticos adula.
É um toma lá dá cá Envolvendo altos valores Empreitadas ministérios Secretários assessores E pra piorar o caso Corrompem corruptores.
SEIS MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO ATUALÍSSIMO
Aderaldo Ferreira de Araújo (Jun/1878 – Jun/1967), oCego Aderaldo, um dos maioresnomes da cantoria e do improviso nordestino de todos os tempos (Ilustração de Walter Caldeira)
Cego Aderaldo
Ah! Se o passado voltasse, Todo cheio de ternura. Eu ainda tinha vista, Saía da vida escura… Como o passado não volta Aumenta minha tristeza: Só conheço o abandono Necessidade e pobreza.
Pelejo e não me acostumo Na capital da Nação Tudo aqui é diferente Das coisas do meu Sertão Lá tiram leite da vaca Aqui é no caminhão.
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Ivanildo Vilanova
É o céu uma abóboda aureolada Rodeada de gases venenosos Radiantes planetas luminosos Gravidade na cósmica camada Galáxia também hidrogenada Como é lindo o espaço azul-turquesa E o Sol fulgurante tocha acesa Flamejando sem pausa e sem escala Quem de nós poderia apagá-la Só o santo doutor da natureza…
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Zé de Almeida
O meu verso já tem se comparado Com o mel da abelha jandaira Com o perfume da flor da macambira Com o campo florido perfumado Com as flores que cobrem todo o prado Com o sol amarelo cor de gema Com o canto feliz da seriema Com o grito saudoso da graúna Com a casca de pau da baraúna E o verdume da folha da jurema.
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Cícero Pedro
Peguei a minha caneta pra fazer mais um poema; poeta tem que versar disponha ou não de um bom tema, dar expressão ao seu estro, deve ser sempre o seu lema.
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Dimas Batista
Os carinhos de mãe estremecida Os brinquedos do tempo de criança O sorriso fugaz de uma esperança A primeira ilusão de nossa vida Um adeus que se dá por despedida O desprezo que a gente não merece O delírios da lágrima que desce Nos momentos de angústia e de desgraça Passa tudo na vida tudo passa Mas nem tudo que a gente passa esquece
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Sebastião Dias
Pra você segunda-feira Eu servirei de correio Quem tiver cartas escreva Que levo um malote cheio Com lágrimas de quem não foi E lembranças de quem não veio
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Um folheto de Antonio Barreto
ESSE CARA SOU EU: RENAN CALHEIROS!
Nas praias de Salvador Num domingo azul-anil Eu disse para mim mesmo: “O negócio está barril! Será que Renan Calheiros É o cara do Brasil?”
De MP3 na mão Resolvi entrevistar As pessoas que chegavam Pra tomar banho de mar… Não faltou foi bom humor Conforme vou relatar!
Antes da noite chegar Encerrei a entrevista Gente de todas as classes Presente na minha lista… Então veja o que disse Nosso povo ao cordelista:
- Roberto Carlos falhou, Eu deixei de ser seu fã! Esse cara tão rretado Não sou eu, nem D. Juan, Esse cara na verdade É o Senador Renan!
Poeta cearense Gonçalo Ferreira da Silva, inspirado folhetista
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Zezo Correia
Canta a cauã com agouro Em cima de uma aroeira No ninho da quixabeira Canta a casaca-de-couro Eu admiro é um louro Lá no oco apertadinho Dentro criar um filhinho Com tanta satisfação Causando admiração A vida de um passarinho.
Vê-se um maracanã Rasgando espiga de milho Pra dar comer a seu filho Todo dia de manhã Também vejo a ribaçã Pôr pelo chão sem ter ninho Deixar o ovo sozinho Depois tirar sem gorar Isso faz admirar A vida de um passarinho.
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Zezé Lulu
Esta palavra ciência, Deus a mim não concedeu A minha mão não escreve Minha boca nunca leu Mas vivo estudando os livros Que a natureza me deu.
Eu admiro a aranha, Pela casa que constrói Cavar no chão um buraco, Para aquele que lhe apoi E botar-lhe uma tampa, Que nem a chuva destroi.
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Moacir Laurentino
Acho bonito o inverno Quando o rio está de nado Que o sapo faz oi aqui Outro oi do outro lado Parece dois cantadores Cantando mourão voltado.
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João Martins de Ataíde Valente não teme luta, Enchente não teme rio, Machado não teme pau, Touro não teme novio, Violão não teme prima, Poeta não teme rima, Eu não temo desafio.
* * *
Antônio Batista Guedes
Longe do mar de Netuno, O cocheiro Faetonte Percorria o horizonte No seu coche de tribuno, De Anfitrite e de Juno, Tinha ele a proteção! Apoio, tendo na mão Um livro de poesia, Me ensinou com galhardia Cantar Dez Pés em Quadrão!
* * *
Geraldo Amâncio
Itapetim és a pista De Louro, Otacílio e Dimas Aonde o carro das rimas Obedece ao motorista Que cada página é revista Escrita em diversas cores És do Pajeú das Flores A mais poética cidade Itapetim, faculdade Que diploma cantadores.
* * *
Zé Adalberto
Improvisar não é ruim, mas é bom que a gente diga que dá frio na barriga, pois sempre começa assim. Eu vim lá de Itapetim pedindo força a Jesus pra que ele me dê luz e assim minha mente cria. Vim derramar poesia no chão dos maracatus.
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José da Rocha Freire (Zé Melancia)
Já fui cantador destemido Cantador de alta classe… Já cantei face a face Com poeta garantido… Com rima e verso medido, Na matéria e em repente, Quem fui eu antigamente, Quem estou sendo hoje em dia, Só resta da melancia A casca e uma semente.
* * *
José Francisco de Souza
O cantador repentista Canta por convicção Tem presença de espírito Para qualquer narração Representa muito bem As belezas do sertão
* * *
Hélio Crisanto
Eu só sei cortar mato de enxada Amansar burro brabo e fazer broca Dar solfejos com flauta de taboca Tirar leite rompendo a madrugada Meu cardápio é queijo com coalhada, Rapadura batida com feijão Já botei muita água de galão Enchi pote com água de barreiro Sou poeta, matuto e violeiro E as histórias que conto é do sertão.
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Um folheto de Gonçalo Ferreira da Silva
PELEJA DE OSCAR ALHO E FRANCISCO MALAGUETA
Quem não leu ainda, leia a mais acirrada e preta peleja que já se viu em cima deste planeta a luta de Oscar Alho e Francisco Malagueta.
Malagueta era filho de João Antônio Barbalho nunca violeiro algum lhe deu o menor trabalho assim queria encontrar-se com o famoso Oscar Alho.
Um DVD do inesquecível Dominguinhos, gravado em Nova Jerusalém-PE , com a duração de 2 hs e 6 min.
É espetáculo para ser visto milhares de vezes e nunca se cansar de admirar essa figura maravilhosa que recentemente partiu para o Oriente Eterno.
Dominguinhos Ao Vivo em Nova Jerusalém
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CHEGADA DE DOMINGUINHOS – Merlânio Maia
- Missão cumprida meu mestre! Domingos diz a Gonzaga, – Ainda estou mêi cansado Mas a alegria me afaga Mas o que estou escutando? – São as sanfonas tocando Hoje é festa o tempo inteiro Chegaste ao Forró de Deus, Vê quantos amigos teus Vê o mundo de forrozeiro?!
É isto o que sempre espera Quem na Terra fez o Bem Quanta gente ajudaste Quanto alegraste também Teu forró fez alegria No lugar onde se ouvia Alentava o coração E Deus viu o quanto é bom Esse luminoso som Xote, Forró e Baião!
Vai ter festa a mais de mês Pois Seu Domingos chegou Na festa da vida eterna Tudo que é bamba tocou E aos braços de Seu Luiz Se sentia tão feliz Desfrutando tais carinhos Naquela festa sem par Sempre ouvia alguém gritar: Bem vindo ao Céu, Dominguinhos!!!
* * *
HOMENAGEM A DOMINGUINHOS – Rafael Neto
O nosso Brasil em peso Triste de luto se veste Dominguinhos já partiu Foi para mansão celeste Deixando eternas saudades No coração do nordeste.
Grande gênio do nordeste Que escreveu sua saga Aos oito anos de idade Conheceu Luiz Gonzaga E quando o rei faleceu Ele assumiu sua vaga.
Sua história não se apaga Que este gênio do sertão Foi um discípulo atuante Do nosso rei do baião Divulgando no Brasil Xote, xaxado e baião.
Com a sanfona na mão Ganhou mais de um troféu A nossa constelação Agora ficou ao léu, Uma estrela da terra Partiu pra brilhar no céu.
Da sanfona e do chapéu Ele nunca se apartou Mas a morte traiçoeira Veio agora e separou A sanfona do artista Que muito nela tocou.
A TV noticiou Pro desespero de Exu Que o seguidor de Luiz Foi também pro barro cru E fica somente a lembrança Da voz deste Uirapuru.
O grande astro de Exu Foi mais deixou um museu Primeiro morreu Luiz E agora um discípulo seu E quem tocará na sanfona Que Luiz Gonzaga deu.
Um câncer lhe ofendeu Ai chegou sua vez, Ele morreu em São Paulo Lá no Sírio-Libanês, Julho de dois mil e treze Terça feira, vinte e três.
Vou lembrar o que ele fez Com a sanfona estimada Agora ele esta no céu Visitando um camarada Deus tá levando os artistas Deixando a terra sem nada.
UM MOTE NO MÊS DE JULGAMENTO DO MENSALÃO E 12 MESTRES DO IMPROVISO
Dois dos maiores nomes contemporâneos da cantoria improvisada de viola nordestina, Geraldo Amâncio e Moacir Laurentino, glosando o mote:
“Os políticos ladrões deste país São iguais aos bandidos traficantes”
Estes improvisos foram feitos na noite de 27 de outubro de 2007 na Concha Acústica ao lado da Catedral Gótica de Petrolina.
Os cantadores só tomam conhecimento do mote no instante em que é lido pelo apresentador, como é de praxe em todo festival de violeiros.
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Biu de Crisanto
Da visão desta janela Eu vi os sonhos perdidos A vida passou por mim Causando dor e gemidos E a esperança morreu No vale dos esquecidos.
O mundo esqueceu de mim Neste cubículo imundo Onde mergulhei nos livros Hora minuto e segundo E fiz diversas viagens Pela vastidão do mundo.
Não esqueço um só segundo Dos dias da mocidade Mas o tempo me roubou Da vida mais da metade Restando só amargura Tristeza, dor e saudade.
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Severino Ferreira da Silva
Visitei lá na Grécia certa hora Li os lindos trabalhos de Pitágoras Bati papo também com Anaxágoras E trouxe a chave da caixa de Pandora Passei perto da Deusa que é Aurora Dei a ela seis raios boreais Assisti no palácio as vestais E de um sopro que eu dei um certo dia Apaguei o farol de Alexandria E o que é que me falta fazer mais?
Escrevi com Camões em Portugal Inspirei a Cervantes na Espanha Junto a Goethe fiquei na Alemanha E nos Açores dei nome a principal Aos poemas de Antero de Quental Eu andei com aedos e andrais Já passei nos castelos dos feudais E coloquei uma vez um trem no trilho Fiz Olívia Palito ter um filho E o que é que me falta fazer mais?
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Pinto do Monteiro
Eu não tenho confiança Em cabra que tem verruga; Cachorro da boca preta, Terreno que pouco enxuga, Comida que doido enjeita E casa que cigano aluga.
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Francisco Maribondo Fui nascido no sertão gosto de tudo que vejo, alimentado com fava batata, feijão e queijo; não nego meu estatuto tenho orgulho em ser matuto cem por cento sertanejo.
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Job Patriota
Aonde chega a verdade pede à mentira que fuja. A virtude esta é tão limpa que o pecado não suja, e a consciência é moeda que o tempo não enferruja.
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Zé Limeira
A Virgem de Nazaré gostava do Evangelho mas casou com um cabra velho por nome de São José. O velho tomava rapé, bebia cana e cuspia. Um dia a Virgem Maria com ele se engrenguenou e quase não nasce o Messias.
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Dimas Mateus Poeta nasce aprendido Deus do céu tudo traduz são nove meses de aula na mulher que nos conduz a faculdade é no ventre da mãe que nos deu a luz’.
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José Alves Sobrinho
Jorram as águas do rio, e elas como uma cobra, num andar lento e macio, descendo e fazendo dobra, derramam sobre o baixio a quantidade que sobra.
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Dimas Bibiu Eu não creio em quem faz economia Passa fome com pena de gastar Vê um pobre faminto não lhe dar Um pedaço do pão de cada dia Tem dinheiro, tem terra, vacaria Nega um copo de leite a uma criança Junta tudo que tem, ainda avança Pra tomar um pedaço do alheio Pode até se salvar, mas eu não creio Só se Deus der um toque na balança!
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Mestre Azulão
A mulher guanabarina em tudo tem perfeição a boca é um cravo abrindo cintura é um violão São Paulo é um deus-nos-acuda só dá mulher barriguda danada por macarrão.
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Josessandro Andrade
Como o teju bebe o leite do aveloz Valdir Teles nos anos de cantoria Come as cobras todas da poesia No raciocínio do verso tão veloz Sua alma veste de veludo a voz Que abala palácios e congressos Penetra corações e ventres com sucesso Se eterniza no íntimo da gente Valdir Teles trinta anos de repente E o tempo não mede o seu universo.
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Geraldo Amâncio
Patativa tinha o brilho da luz de um meteorito; um homem que virou gênio, um gênio que virou mito; um cantador de roçado que foi por Deus convocado pra cantar no Infinito.
DEZ MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Mocinha de Passira e Santinha, duas mulheres no mundo masculino da cantoria improvisada de viola
Mocinha de Passira
Quem vem de raça de puta não fala de rapariga sua mãe é leviana sua avó é quenga antiga a sua filha ganha a feira vendendo o pé da barriga
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Amor é vinho servido Em alva taça pequena Quem bebe pouco quer mais Quem bebe mais se envenena Quem se envenena de amor Morrendo Deus não condena.
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A vida se inicia Sob o ventre maternal O filho se liga à mãe No cordão umbilical Nasce, cresce, vive e ama Depois a morte lhe chama Para a cama sepulcral.
André Serafim
Diz a antiga escritura Que Adão foi feito de barro, Mas essa história eu não narro Porque é mentira pura. Tem camarada que jura Por São Pedro e São Conrado, Mas acho que teja errado, Que Deus nunca foi “loiceiro” Pra tá dentro dum barreiro Fazendo cabra safado.
Canhotinho
Acho tarde demais para voltar estou cansado demais para seguir, os meus lábios se ocultam de sorrir, sinto lágrimas, não posso mais chorar; eu não posso partir e nem ficar e assim nem pra frente nem pra trás, pra ficar sacrifico a própria paz, pra seguir a viagem é perigosa, a vereda da vida é tão penosa que me assombro com as curvas que ela faz.
Manoel Filó
Cantador pra enfrentar Manoel Filó É preciso comer besouro assado Dar pancadas com o gume do machado Num angico que tem um sanharó Se enrolar com uma cobra de cipó Dar um chute num cão com hidrofobia Mastigar na cabeça de uma jia Se subir num coqueiro catolé Se montar em Inácio Jacaré E viajar três semanas pra Bahia.
Lycurgo Paiva
Um dia tive saudades Daquelas matas viçosas Das brisas tão soluçosas, Dos ares de meu sertão. Era de tarde – no sitio - Tudo era grave e sentido, Como da rola o gemido Perdido na solidão.
Louro Branco
O trovão estronda andando Pelo firmamento infindo, Céu de nuvens se cobrindo Cascatas cantarolando, O pirilampo voando Em noites de escuridão, Só parece um avião Com a sinaleira acesa; Tudo que há de beleza Deus colocou no sertão.
Diniz Vitorino
E as abelhas pequenas, sempre mansas Com as asas peludas e ronceiras Vão em busca das pétalas das roseiras Que se deitam no colo das ervanças Com ferrões aguçados como lanças Pelo cálix das flores bebem essência E fazem mel que os mestres da Ciência Com os séculos de estudo não fabricam Porque livros da Terra não publicam Os segredos reais da Providência.
José Lucas de Barros
A lua, barco risonho, No seu posto ingênuo e belo, Era o mimoso castelo Da poesia e do sonho, Mas o astronauta medonho Lá chegou bastante cedo, E, como no seu degredo Esperava um trovador, Ao ver um explorador A lua tremeu de medo.
José Alves Sobrinho
Eu canto sextilha, oitava e martelo Mourão de seis pés, de cinco e de sete Canto carretilha, tudo que compete Ao homem que canta repente em duelo Faço fortaleza , construo castelo Sou mestre de ritmo , aprendi rimar Conheço o segredo de metrificar E meço o compasso das minha expressão Ouvindo as pancadas do meu coração Cantando galope na beira do mar.
Otacílio Batista
Ao romper da madrugada, um vento manso desliza, mais tarde ao sopro da brisa, sai voando a passarada. Uma tocha avermelhada aparece lentamente, na janela do nascente, saudando o romper da aurora, no sertão que a gente mora mora o coração da gente.
O cantador violeiro longe da terra querida, sente um vazio na vida, tornando prisioneiro, olha o pinho companheiro, aí começa a tocar, tem vontade de cantar, mas lhe falta inspiração. Que a saudade do sertão faz o poeta chorar.
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A PELEJA DE LEANDRO GOMES COM UMA VELHA DE SERGIPE – Leandro Gomes de Barros
Eu ainda estava orelhudo Com estes versos que faço Porque nunca achei poeta Que me fizesse embaraço Porém uma velha agora Quase me quebra a cachaça
A velha fez-me subir Onde nem urubu vai Andei numa dependura Já está cai ou não cai Ainda chamei tio o gato Tratei cachorro por pai
Quando partiu foi babando O corpo vinha tremendo Antes de dar boa noite De longe me foi dizendo: “Meu amigo eu venho metê-lo Entre um quente e dois fervendo”
UM MOTE BEM GLOSADO E UM FOLHETO DE LEANDRO GOMES DE BARROS
Enoc Ferreira glosando o mote:
Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
O Sertão está sendo castigado Pela seca cruel que nos comove Faz dois anos completos que não chove Acabou-se a fartura do roçado Não tem pasto pra o gado no cercado Desse jeito se acaba a criação Morre um bicho por falta de ração Falta até urubu pra lhe comer Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão
Já passou-se Janeiro não choveu Fevereiro foi seco não pingou Quando em março o inverno começou Porém só uma chuva nele deu Quem plantou a lavoura se perdeu Com quarenta e seis dias de verão Já que o povo não tem outra opção A vingança que tem é só dizer: Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
Eu só sei que daqui pra o fim do ano É certeza que a água vai faltar Pra beber, pra lavar, pra cozinhar Só se for de algum poço artesiano Nessa água quem for lavar um pano, Ela corta a espuma do sabão Da que encrua caroço de feijão Assim mesmo é melhor do que não ter Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
Sem chover o Sertão não vale nada Pois a seca só trás calamidade Carro-pipa abastece uma cidade Mas água que traz é limitada Vê-se a fila de latas na calçada Todo mundo esperando o caminhão Nisso o povo se agita ,faz pressão Que o prefeito só falta endoidecer Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
Essa seca perversa foi quem fez A miséria cruel que está se vendo A pobreza humilhada recebendo Uma feira que vem de mês em mês Mas a feira que veio da última vez Só foi óleo fubá e macarrão Q Quando vem um punhado de feijão Não há fogo que faça amolecer Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
Sertanejo tornou-se um flagelado De lucrar já perdeu a esperança Por que tudo demais a gente cansa Esse povo já está desenganado Disse um velho que vinha do roçado: Já perdi toda minha plantação Pra acabar com a safra de algodão Só faltava o bicudo aparecer Se passar mais um ano sem chover Vai ficar pouca gente no Sertão.
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Um folheto de Leandro Gomes de Barros
O COMETA
Caro leitor vou contar-lhe O que foi que sucedeu-me, O medo enorme que tive, Que todo corpo tremeu-me, Para falar a verdade Digo que o medo venceu-me.
Eu andava aos meus negócios, Na cidade de Natal, No hotel que hospedei-me Apareceu um jornal, Que dizia que no céu Se divulgava um sinal.
O sinal era o cometa Que devia aparecer, Em Maio, no dia 18 Tudo havia de morrer, Aí sentei-me no banco, Principiei a gemer.
O grande poeta repentista Geraldo Amâncio, um cearense que já levou sua arte até pro exterior
Todas as glosas a seguir são da autoria de Geraldo Amâncio
Mote:
Toda lei ultrapassada Só favorece o bandido.
Se for um parlamentar Pode ter crime a vontade Que o dedo da impunidade Não deixa lhe investigar. Se alguém o denunciar É sujeito a ser punido, Processado e ser tangido Pra o beco da emboscada; Toda lei ultrapassada Só favorece o bandido.
Mote:
Não tem nada parecido Com o amor da mãe da gente.
A mãe nova ou mãe antiga Tem coragem como loba Se tem um filho que rouba Pra defendê-lo se obriga Se a polícia lhe investiga Diz que o filho é inocente Grita, chora, jura e mente Defende o filho bandido. Não tem nada parecido Com o amor da mãe da gente.
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Mote:
Pra que tanto tesouro acumulado Se ninguém leva nada no caixão.
Não adianta um pecador enganar E nessa vida viver da fase crítica Entre luta, entre roubo, entre política Pra depois nesse mundo ele enricar Que se a gente também for comparar Desde um rico para um pobre cristão Para Deus vale mais quem pede um pão Do que um presidente ou deputado Pra que tanto tesouro acumulado Se ninguém leva nada no caixão.
Mote:
O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
Quem foi pai do folheto nordestino Foi Agostinho Nunes do Teixeira, Escreveu a história pioneira Com os filhos Nicandro e Ugolino. Prosseguiu com Germano e com Silvino, Eis aí a primeira geração. O romance no estado de embrião Fervilhou no poder imaginário, O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
Teve berço no chão paraibano, Da cultura do povo um grande guia, Registrou a primeira cantoria Na peleja de Inácio com Romano. A memória do padre Otaviano Levou luz onde havia escuridão, O veículo maior de informação E o primeiro jornal do proletário O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
O cordel memoriza a cantoria Na peleja de Pinto com Marinho, Com o Cego Aderaldo e Zé Pretinho, O que via apanhou do que não via. Zé Gustavo e Roxinha da Bahia, Nisso tudo aparece até o cão, Na peleja do Diabo e Riachão Foi Assu testemunha do cenário, O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
A maior expressão do menestrel Não há força que atinja o seu alcance O campônio conhece por romance Ou então por folheto de papel. Só depois veio o nome de cordel, Que em feira era exposto num cordão Ou então numa lona pelo chão E um poeta a cantar feito um canário. O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
Registrando o passado e o presente, Para tudo o cordel tem sempre espaço: Pra amor; pra política, pra cangaço, Romaria, promessa e penitente. Retirante, romeiro, presidente, Seca, fome, fartura, inundação, Nele encontra o melhor documentário, O cordel completou um centenário Viajando nas asas do pavão.
São José do Egito, sertão pernambucano, onde se encontra poesia até nas paredes das casas:
MINHA TUDO! SÃO JOSÉ DO EGITO – Brás Ivan Costa Santos
Cada verso que faço é para ti Como eram pra ti os que não fiz Cada frase poética que desfiz Era tua na hora que escrevi.
É assim desde o dia em que te vi Aprendi a sofrer sendo feliz Quando fujo de ti meu peito diz Quanto ingrato eu fui quando fugi.
Nunca mais fiz um verso que prestasse Quando faço uma rima é só disfarce Escondendo a saudade do meu grito
Pois sem ti o meu verso é só metade Sem te ver, musa mãe, mulher cidade Minha tudo! São José do Egito.
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RIO PAJEÚ – João Paraibano
Pajeú, teu cenário me encanta Desde a voz do vaqueiro aboiador, Ao Verão que desbota a cor da planta, E a abelha que bebe o mel da flor.
O refúgio da caça que se espanta No chiado dos pés do caçador, A romântica canção que o rio canta Na passagem de um ano chovedor.
Quando a chuva da nuvem inunda as grotas O volume da água banha Brotas, E onde a curva do rio faz um U…
Nasce um pé de esperança no teu povo; Tudo indica que Cristo quando novo Aprendeu a caminhar no Pajeú.
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ANTÔNIO CONSELHEIRO – Patativa do Assaré
Cada um na vida tem seu O direito de julgar. Como tenho o meu também, Com razão quero falar Nestes meus verso singelos, Mas de sentimentos belos Sobre um grande brasileiro, Cearense, meu conterrâneo. Líder sensato, espontâneo, Nosso Antônio Conselheiro
Este cearense nasceu Lá em Quixeramobim. Sei eu sei como ele viveu, Sei como foi o seu fim. Quando em Canudos chegou, Com amor organizou Um ambiente comum, Sem enredos nem engodos, Ali era um por todos E eram todos por um
Não pode ser justiceiro E nem verdadeiro é O que diz seu Conselheiro , Enganava a boa fé O Conselheiro queria Acabar com a anarquia Do grande contra o pequeno. Pregava no seu sermão Aquela mesma missão Que pregava o Nazareno.
Com a sua simpatia, Honestidade e brio Ele criou na Bahia Um ambiente sadio Onde vivia tranquilo, Ensinando tudo aquilo Que a moral cristã encerra. Defendendo os desgraçado Do julgo dos potentados, Dominadores da terra.
Seguindo um caminho novo, Mostrando a luz da verdade, Incutia entre o seu povo, Amor e fraternidade Em favor do bem comum, Ajudava a cada um Foi trabalhador e ordeiro, Derramando o seu suor. Foi ele o líder maior Do nordeste brasileiro.
(Quando do falecimento do poeta popular Genário Vieira da Silva)
Genário, meu camarada, encerras tua jornada hoje em teu sepultamento. Ontem, poeta, escrevias inspiradas poesias repletas de sentimento.
Mas a morte, traiçoeira, te ceifou dessa maneira, independente de aviso, nos deixando consternados, corações amargurados sem que isso fosse preciso.
Tua esposa, Mariquinha, vai ficar triste e sozinha, amargando a sua dor, tendo por consolação guardadas no coração as marcas do teu amor.
Num final triste de junho, como todos, me acabrunho por perder um grande amigo, poeta de qualidade que deixa luto e saudade ao se encerrar num jazigo.
Ainda ontem, poeta, perseguindo a tua meta, parecias tão ditoso! Cantavas a nossa terra: cada rua e cada a serra deste jardim majestoso.
Mas nem sempre se consegue aquilo que se persegue… A vida é cheia de engodos. Nosso Pai celestial é quem decide, afinal, o destino de nós todos.
Sendo assim, poeta amigo, vai, porém leva contigo essa sentida homenagem. Para nós tu não morreste, pois os versos que escreveste perpetuarão tua imagem.
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NOS CAFUNDÓ DO SERTÃO – Onildo Barbosa
Caco de cuia, cabaça, Tacho de barro coité, Urupema, jereré, Baleeira e alçapão, Gamela de mulungú, Trinchête, pinhão, ponteira A gente avista na feira, Nos cafundó do sertão.
Enfileira de piaba, Cangatí, cará, corró, Pau de cangalha, bozó, Candeeiro, lampião, Caçuá, jarra, quartinha, Machado, foice e peneira, A gente avista na feira, Nos cafundó do sertão.
Mel de cana, rapadura, Caco de fazer pipoca, Fogo de flecha, taboca, Torradeira de assar pão, Alfinim, caldo de cana, Chapéu de couro e perneira, A gente avista na feira Nos cafundó do sertão.
Trança de alho, arapuca, Quixó, de pegar preá, Sacola de caroá, Cabo de enxada, mourão, Lamparina à querosene, Dobradiça de porteira, A gente avista na feira, Nos cafundó do sertão.
Chinelo de couro cru, Marra, chocalho, sacola, Grampo de cerca, gaiola, Bodoque, mão de pilão, Serrote, sela, cabresto, Banco de pau e cadeira, A gente avista na feira Nos cafundó do sertão.
Severino de Andrade Silva, mais conhecido como Zé da Luz, nasceu na cidade paraibana de Itabaiana em 1904, foi um alfaiate de profissão e poeta popular brasileiro; morreu no Rio de Janeiro em 1965
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A CACIMBA
Tá vendo aquela cacimba Lá na bêra do riacho, Im riba da ribancêra, Qui fica, assim, pru dibaxo De um pé de tamarinêra?
Pois, um magote de môça Quage toda menhanzinha, Foima, assim, aquela tuia, Na bêra da cacimbinha Tomando banho de cuia!
Eu não sei pru quê razão, As águas dessa nacente, As águas qui alí se vê, Tem um gosto deferente Das cacimba de bêbê…
As águas da cacimbinha Tem um gôsto mais mió. Nem sargada, nem insôça… Tem um gostim do suó Dos suvaco déssas môça…
Quando eu vejo essa cacimba, Qui inspio a minha cara E a cara torno a inspiá, Naquelas águas quilara, Pego logo a desejá…
…Desejo, pra que negá? Desejo ser um caçote, Cum dois óio desse tamanho! Pra vê, aquele magóte De môça tumando banho!
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BRASI CABOCO
O qui é Brasí Caboco? É um Brasi diferente do Brasí das capitá. É um Brasi brasilêro, sem mistura de instrangero, um Brasi nacioná!
É o Brasi qui não veste liforme de gazimira, camisa de peito duro, com butuadura de ouro… Brasi caboco só veste, camisa grossa de lista, carça de brim da “polista” gibão e chapéu de coro!
Brasi caboco num come assentado nos banquete, misturado cum os home de casaca e anelão… Brasi caboco só come o bode seco, o feijão, e as veiz uma panelada, um pirão de carne verde, nos dias da inleição quando vai servi de iscada prus home de posição.
Brasi caboco num sabe falá ingrês nem francês, munto meno o português qui os outros fala imprestado… Brasi caboco num inscreve; munto má assina o nome pra votar pru mode os home Sê gunverno e diputado Mas porém. Brasi caboco, é um Brasi brasileiro, sem mistura de instrangero Um Brasi nacioná!
É o Brasi sertanejo dos coco, das imbolada, dos samba, dos vialejo, zabumba e caracaxá! É o Brasi das vaquejada, do aboio dos vaquero, do arranco das boiada nos fechado ou tabulero! É o Brasi das caboca qui tem os óio feiticero, qui tem a boca incarnada, como fruta de cardoro quando ela nasce alejada!
É o Brasi das promessa nas noite de São João! dos carro de boi cantano pela boca dos cocão.
TRÊS CANTORIAS E UM FOLHETO DO FUBÂNICO JOSÉ HONÓRIO
Poetas repentistas Acrisio de França e Antonio Costa glosando o mote:
“Esse meu coração mal dirigido continua a bater na contra mão”
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Poetas repentistas Louro Branco e Geraldo Brito:
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Poetas repentistas Valdir Teles e João Paraibano:
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José Honório da Silva
A VOLTA DE VIRGULINO PRA CONSERTAR O SERTÃO
Conta Caetano Veloso Num verso espetacular: “Minha mãe me deu ao mundo De maneira singular Me dizendo uma sentença Pra eu sempre pedir licença Mas nunca deixar de entrar”
E por isso eu peço à História E aos guardiões da verdade Permissão para escrever Com natural liberdade Solto no tempo e no espaço Um tema sobre Cangaço Justiça, Moralidade.
O tempo bom já se foi Muita gente pensa assim E se a vida era difícil Por certo está mais ruim Parece até que este mundo Mergulha num caos profundo Já decretando o seu fim.
Hoje em dia só se vê Guerra, sequestro, atentado Miséria, fome, doença Vulcão, enchente, tornado Desemprego, violência Corrupção, indecência Se espalham por todo lado.
Os jovens sem esperança Que haja melhores dias Se entregam logo às drogas Às badernas e às orgias Amparando-se em galeras Se tornam vorazes feras Fazendo selvagerias.
O homem que bem pensar Não tira a vida de um grilo A mata fica calada O bosque fica intranquilo A lua fica chorosa Por não poder mais ouvi-lo
* * *
Manoel Bentevi
Minha carne só é nervo e cabeloro O espinho de juá bate e não fura Minha saliva salva qualquer mordedura Se a jiboia morder por desaforo Tiro o veneno da bicha faço soro E dou vida a qualquer um ser vivente Seja qual for a qualidade da serpente Estando mesmo quieta ou assanhada Por acaso ela me dando uma picada É capaz de ficar sem nenhum dente.
* * *
Nonato Costa
Quem compete com os anos perde a luta Sem nenhum artefato de defesa, Pois o fórum de Deus ganha a disputa Decretando a falência da beleza, As madeixas caindo a pele verte, Não tem creme hidratante que conserte, E nenhum tipo de plástica que ajude, Na agência bancária do futuro O presente começa a pagar juro Do empréstimo que fez na juventude.
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Mariana Teles
O levantar da cabeça É sempre a melhor saída Passar por cima dos baques, Molhar com pranto a ferida, Sem cansar, nem pedir pausa, Na queda se enxerga a causa Dos recomeços da vida!
* * *
João Paraibano
Faço da minha esperança Arma pra sobreviver Até desengano eu planto Pensando que vai nascer E rego com as próprias lágrimas Pra ilusão não morrer.
* * *
Zé Melancia
Já fui cantador destemido Cantador de alta classe… Já cantei face a face Com poeta garantido… Com rima e verso medido, Na matéria e em repente, Quem fui eu antigamente, Quem estou sendo hoje em dia, Só resta da melancia A casca e uma semente
* * *
Cícero Vieira da Silva
Nasci numa cordilheira Numa casa muito ruim, As telhas eram de capim E a porta era uma esteira; No pé de uma ladeira Foi onde fizeram ela Se um gato subisse nela Só faltava derribar… Antes da chuva chegar Já chovia dentro dela.
OITO MESTRES DO IMPROVISO E A DISCUSSÃO DO MACUMBEIRO E O CRENTE
Diniz Vitorino
E as abelhas pequenas, sempre mansas Com as asas peludas e ronceiras Vão em busca das pétalas das roseiras Que se deitam no colo das ervanças Com ferrões aguçados como lanças Pelo cálix das flores bebem essência E fazem mel que os mestres da Ciência Com os séculos de estudo não fabricam Porque livros da Terra não publicam Os segredos reais da Providência.
* * *
Manoel Bentevi
Da bobina para o distribuidor Há um cabo que passa uma centelha clara Meto o pé no arranco, ele dispara Toda vez que acelero meu motor O combustível entra no carburador A entrada de ar transforma o gás Com a compressão que ele faz Forma o jato, o êmbolo vai subindo Vai queimar na cabeça do cilindro A fumaça da gasolina sai por trás.
* * *
Mariana Teles
Toca a brisa da noite no portão O cabelo se assanha com o vento O balanço da rede em movimento E um rádio tocando uma canção A saudade arranhando um coração E a duvida de um sempre, ou nunca mais Uma lágrima caindo e o vento faz Se espalhar pela face entristecida Eu na rua buscando achar saída Pra tristeza que a tua falta trás.
Faço um verso, misturo com aguardente Um cinzeiro com as cinzas do veneno Numa noite sem lua me enveneno Por não ter o clarão do céu presente O espelho espelhando em minha frente A metade de um todo que foi nosso Eu procuro não ver, mas tem um troço Pra abrir os meus olhos quando fecho Sem ter sono, inquieta me remexo Que dormir sem você ,sei que não posso.
Vem o vento, tocar-me bem mais forte O relógio passando sem medida Ao meu lado, um copo de bebida Refletindo o futuro : que é a morte … Nele afogo o desgosto, já que a sorte Resolveu repartir nossa união Te guiando pra outra direção E deixando meus olhos sem os teus… De lembrança ,restou o teu adeus E a saudade entupindo o coração.
* * *
João Lourenço
Eu já passei tanta coisa Que na vida nem pensava Pra minha felicidade A mulher que eu procurava Deus teve pena de mim Mostrou aonde ela estava
* * *
Fenelon Dantas
O rádio é para se ouvir E todo mundo entender O telefone é melhor Para a gente ouvir sem ver No telefone eu namoro Sem minha mulher saber.
GRANDES MOTES, GRANDES GLOSAS E UM FOLHETO DE DISCUSSÃO
Poeta Hélio Crisanto, colunista do JBF e sacerdote da Igreja Sertaneja
Hélio Crisanto glosando o mote:
Sou poeta, matuto e violeiro E a história que conto é do sertão
Eu só sei cortar mato de enxada Amansar burro brabo e fazer broca Dar solfejos com flauta de taboca Tirar leite rompendo a madrugada Meu cardápio é queijo com coalhada, Rapadura batida com feijão Já botei muita água de galão Enchi pote com água de barreiro Sou poeta, matuto e violeiro E a história que conto é do sertão
* * *
Jó Patriota glosando o mote:
Tudo quanto eu sofrer na minha vida Só me queixo da tua ingratidão.
Eu pensei que tu eras inocente Como a Virgem quando foi anunciada Por mim mesmo tu foste comparada Com a estrela Dalva refulgente Que guiou os três reis do Oriente À visita do Pai da Criação Mas agora provaste a revelação Que tiveste comigo foi perdido Tudo quanto eu sofrer na minha vida Só me queixo da tua ingratidão.
Tu de falsa roubaste o meu amor Tu não tens coração mulher ingrata Teu fingir cada vez mais me maltrata Mais eu sofro, mais gemo, tenho dor Se ao menos não fosse um cantador Não conhecesse saudade nem paixão Pois quem é desprezado sem razão Perde até o direito da dormida Tudo quanto eu sofrer na minha vida Só me queixo da tua ingratidão.
* * *
Carlos Alexandre glosando o mote:
Um castelo de sonhos foi desfeito No momento da nossa despedida.
Só consegue entender o meu tormento Quem um dia sofreu por rejeição É mais forte essa dor no coração Quanto mais verdadeiro o sentimento É difícil abrandar um sofrimento Por paixão que não foi correspondida Mas a dor se apresenta mais doída Quando faz da saudade o seu efeito Um castelo de sonhos foi desfeito No momento da nossa despedida.
O seu rosto há muito que não vejo E a dor da saudade só aumenta Pois a sua presença não se ausenta Das lembranças que tenho de sobejo Reconheço que ainda lhe desejo Abrigando esperanças sem medida Mas se nunca por mim foi esquecida Só a vejo em meus sonhos quando deito Um castelo de sonhos foi desfeito No momento da nossa despedida.
* * *
Cordeiro Manso glosando o mote:
Fiz deixação da enxada Por ser um ferro ruim Quando eu puxava por ela Ela puxava por mim.
Não sei quem foi que inventou Aquele ferro malvado Um bicho malamanhado Só sendo o cão que forjou Porque Deus que nos criou Não deixou coisa malvada Depois da bicha encaibada Só faz é calo na mão Por essa grande razão fiz deixação da enxada.
Eu comprei uma enxada botei um cabo de pau porem aquele ferro mau me deu uma canelada deixou-me de unha arrancada nunca vi doer assim! Foi um enfado sem fim meu corpo todo doía até que deixei um dia por ser um ferro ruim.
Eu deixei por um motivo qual me queixo a vida inteira Quando limpei três carreiras Estava mais morto que vivo Tomei um nota no livro Para não esquecer mais dela Com suor e mela-mela Quase queimou a botica o suor corria em bica quando eu puxava por ela.
Vi-me em tormentos cruéis com tal ferro arrenegado se puxava pra meu lado lá vinha cortar-me os pés eu não tenho meus derréis para dar por tal Caim que deixou-me surubim com mormos pela canela quando eu puxava por ela, ela puxava por mim.
Antônio Gonçalves da Silva, o Patativa do Assaré (Mar/1909 – Jul/2002)
1) A TRISTE PARTIDA (interpretado por Luiz Gonzaga)
* * *
2) A MULHER QUE MAIS AMEI
Era um modelo perfeito A mulher que mais amei, Linda e simpática de um jeito Que eu mesmo dizer não sei. Era bela, muito bela; Para comparar com ela, Outra coisa eu não arranjo E por isso tenho dito Que se anjo é mesmo bonito, Era o retrato dum anjo.
Sei que alguém não me acredita, Mas eu digo com razão, Foi a mulher mais bonita De cima de nosso chão; Era mesmo de encomenda E do amor daquela prenda Eu fui o merecedor, Eu era mesmo sozinho Dono de todo carinho Daquele anjo encantador.
Era bem firme a donzela, Só em mim vivia pensando. Quando eu olhava ela, Ela já estava me olhando. Para a gente conversar Quando eu não ia, ela vinha, Um do outro sempre bem perto Nosso amor dava tão certo Quem nem faca na bainha.
E por sorte ou por capricho, Eu tinha prata, ouro e cobre. Dinheiro em mim era lixo Em casa de gente pobre. Nós nunca perdíamos ato De cinema e de teatro De drama e mais diversão, Não faltava coisa alguma, As notas eu tinha de ruma Para nós andar de avião.
Meu grande contentamento, Não havia mais maior E nossos dois pensamentos Pensava uma coisa só. Para desfrutar a minha vida Perto de minha queria Eu não poupava dinheiro. Tanta sorte nós tivemos Que muitas viagens fizemos Nas terras do estrangeiro.
E quando nós se trajava E saía a passear O povo todo arredava Para ver nos dois passar Cada qual mais prazenteiro Deste nosso mundo inteiro Nós dois éramos os mais feliz Vivíamos nas altas rodas E só trajava nas modas Dos modelos de Paris.
Assim a vida corria E o prazer continuava Aonde um fosse o outro ia Onde um tivesse o outro estava; Para festa de posição Das mais alta ingorfação Nunca faltava convite Para dizer a verdade A nossa felicidade Já passava dos limites
Era boa a nossa sorte E não mudava um segundo Ninguém pensava na morte E o céu era aqui no mundo. Na refeição nós comia Das melhores iguarias Sem falar de carne e arroz E por isso muita gente Ficava rangendo os dentes Com ciúmes de nós dois.
Foi uma coisa badeja A vida que eu desfrutei, Mas para quem tiver inveja Dessa vida que levei Com tanta felicidade, Eu vou dizer a verdade, Pois não engano ninguém. Aquele anjinho risonho Eu vi foi durante um sonho; Mulher nunca me quis bem!
A história não foi verdade, Todo sonho é mentiroso Aquela felicidade De tanto luxo e de gozo Sem o menor sacrifício, Foi negócio fictício, Não foi coisa verdadeira. Eu fiquei dando o cavaco: “Este alimento fraco Só dá para sonhar besteira.”
De noite eu tinha jantado Um mugunzá sem tempero E acordei alvoroçado Sem mulher e sem dinheiro; Ainda reparei bem Para vê se via alguém De junto de minha rede Mas, em vez de tudo aquilo Só ouvi cantando o grilo Nos buracos da parede.
Quando acordei estava só Sem ter ninguém do meu lado, Era muito mais melhor Que eu não tivesse sonhado. Quem já vai no fim da estrada Levando a carga pesada De sofrimento sem fim, Doente, cansado e fraco Vem um sonho enchendo o saco Piorar quem já está ruim.
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3) CONVERSA DE MATUTO
Meu amigo João Moiriço, Eu agora fiquei certo Que nóis já tá bem perto De sair do sacrifico. Eu onte uvi num comiço De um dotô candidado, Home sero e muito isato E ele garantiu que agora Vai havê grande miora Para o pessoá do mato.
No comiço ele falou Que depois que ele vencê, Vai com gosto protegê A cada um inleitô. O povo trabaiadô Que padece no roçado Pode votá sem coidado Que depois das inleição Com a sua proteção Vai tudo recompensado
DEZ MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO COM TEMA ATUAL
Poeta repentista cearense Geraldo Amâncio, um dos maiores cantadores da Nação Nordestina na atualidade
Geraldo Amâncio
Entre os Dez Mandamentos dos sermões, Respeitar pai e mãe é o primeiro, O defeito de um filho é ser grosseiro; A virtude dos pais é serem bons. Todo filho tem três obrigações: Escutar, respeitar e obedecer; Respeitar pai e mãe é um dever; Esquecer mãe e pai é grosseria, Se não fossem meus pais, eu não teria O direito sagrado de viver.
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José Moura
Toda noite eu me deito constrangido Como um ente que vive em abandono, Passo horas inteiras sem ter sono E só durmo depois de um comprimido. Quando acordo é nervoso e abatido, Os meus sonhos são cheios de aflição, Aí rezo com fé uma oração Chegam mil esperanças novamente. Acredito que Deus está presente No silêncio da minha solidão.
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Lourival Batista
De fato meu companheiro Muito velho já estou Completei sessenta anos Já fui pai, já sou avô Pra mulher, não sou mais nada Mas pra quem canta, inda sou.
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Louro Branco
E por falar em cachaça Eu já tomei mais d’um tubo Estou feito terra fraca Precisando de adubo Em mulher num subo mais Mas em cantador eu subo.
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Dedé Monteiro
No dia de abandonar O meu torrão querido, Ouvi meu próprio gemido A me pedir pra ficar… Mas, vendo que de voltar Havia pouca esperança, Triste como uma criança Que está com fome ou com sede No punho da minha rede Deixei um nó por lembrança.
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Zé Catota
Meu sonho foi diferente Foi coisa desconhecida Eu vi dois vultos passando Em carreira desmedida Era o cavalo do tempo Atrás da besta da vida.
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Josenir Lacerda
A poesia pra mim É uma amiga sincera Que assume meus queixumes Faz de inverno, primavera Compreende os meus medos Guarda fiel meus segredos Meu sonho, minha quimera.
Os jovens poetas cantadores Raimundo Nonato e Nonato Costa (Os Nonatos)
A dupla Raimundo Nonato e Nonato Costa trabalhando o mote
Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Você pode habitar em outro ninho E visitar ambientes que eu não vou Trabalhar, viajar, assistir show Sem que eu seja uma sombra em seu caminho Se negar a aceitar o meu carinho Não sentir mais saudade de me ver Só não pode é no intimo do meu ser Passar uma borracha e apagar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Só restaram do amor que foi desfeito Os melhores momentos dessa história As lembranças do vídeo da memória E as promessas no cofre do meu peito Aceitar que perdi, eu não aceito Mas estou consciente de não ter Nunca mais o direito de poder Pelo menos na boca lhe beijar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Você tem o direito de exigir Que eu me afaste de vez da sua vida Que não sente mais falta na dormida Que não tem mais lembrança de sair Mas você nem ninguém pode impedir Que eu escute isso tudo sem sofrer E se me ver gargalhando pode crer Que por dentro eu não paro de chorar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Porque sua beleza não é pouca Não existe uma réplica nem seu clone E sua voz de CD no telefone Inda deixa minh’alma quase louca Se outro homem beijar a sua boca E num abraço apertado lhe prender Se eu chegar a ver isso e não morrer Pelo menos em coma eu vou ficar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Por mais vezes que eu lute e que ele tente Me recuso a ouvir certos boatos É inútil eu rasgar os seus retratos Se você tá inteira em minha mente Já liguei pro trabalho estava ausente E onde estava negaram a me dizer No de casa não quer mais me atender Mas eu tô rastreando o celular Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Fiz diversas consultas no INCOR Pra saber o que eu tinha de verdade O eletro acusou que era saudade E se você não voltar fica pior Vou mandar escrever num outdoor Uma declaração pra você ler Tenho tanta paixão que pra caber Só se meu coração virasse um mar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
Certamente adorá-la foi meu crime Nem por isso eu estou arrependido Você pode dizer que tem marido Que tem filho e não quer que eu me aproxime Não existe outra pele mais sublime E outro cheiro melhor não pode haver Seu amor não é coisa de comer Mas eu fico sem fome se provar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer. Inda tenho comigo seu cartão Telefone, endereço, carta e foto Lhe dei todo meu tempo e hoje noto Que não tenho um minuto de atenção Mergulhado no cais da solidão Sem nenhuma noticia receber Prometi pra mim mesmo não querer Nunca mais por ninguém me apaixonar Você pode pedir preu me afastar Só não pode obrigar-me a lhe esquecer.
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João Paraibano glosando o mote:
Sinto a nossa esperança se queimando Nas fogueiras da seca nordestina.
Não escuto um trovão estremecer Uma nuvem no céu ninguém enxerga A lavoura sedenta se enverga Procurando o chão seco pra morrer Na pequena cacimba de beber Você cava uma veia ela não mina Você olha pra os seios da campina Só tem foco de incêndio levantando Sinto a nossa esperança se queimando Nas fogueiras da seca nordestina.
É a seca matando nosso gado E o governo a achar tudo normal… Pois preferem falar em copa, em festa. Isso aí dá mais voto, é mais legal. E essas secas se encaixam feito luva: Pois se vê no Sertão seca de chuva, Nos políticos a seca de moral.
Cada esfera que culpe a outra esfera O prefeito que diz que nada fez, Pois o líder do estado é quem devia… Esse aí, pra fugir, por sua vez, Joga a culpa no líder da nação, Entretanto nos tempos de eleição Vêm os três pedir votos para os três.
E o pior é o silêncio que faz eco, Maquiando a real situação. Quando a chuva voltar, vejo os discursos: “Pronto, gente, não há mais sequidão, Nesta seca tomamos as medidas E por isso salvamos muitas vidas…” Quem quiser que acredite, mas eu não.
Vamos, gente, se movam, falem, gritem, Cobrem mais dos políticos deste chão… Ou preferem ver cenas como esta Cada vez que vier novo verão? Não se curvem pra vil politicagem, Pois quem é deste chão, sem ter coragem, Não merece ser filho do Sertão!
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A SECA E A MÁ VONTADE POLÍTICA – Henrique Brandão
O acalanto maior Pro coração sertanejo É ver riacho em enchente Da bica ouvir o gotejo Porém quando a chuva atrasa Deixa o sertão feito brasa Queimando a alma da gente Deixa a paisagem cinzenta E a bicharada sedenta Deitada no solo quente.
Nossa terra infelizmente Sofre com a má vontade De uma corja que castiga Sem dó e sem piedade Mas nosso povo com isso Que nunca foi submisso Segue de cabeça erguida Rezando e olhando pro céu Pois quem tem deus é fiel E nem seca atrasa sua vida.
Não é por causa da seca Que o povo sofre e lamenta No ano seco ele sofre Mas por ser forte ele aguenta O que deixa indignado É ver o povo cansado De mentira e de promessa Ser for pra ajudar, que venha Se não, bem longe mantenha Pois que tem fome, tem pressa.
Enquanto gastam milhões Sem lembrar do sertanejo Metem a cara na tv Pra oferecer sobejos Isso não é arrogância Mas quem vive na abundância Nosso sertão tudo tem Não se anima com conversa Pois nem queremos promessa Nem esmola de ninguém.
Se a seca é realidade Mude logo o pensamento Irrigue esse solo fértil Pra produzir alimento Não deixe um povo feliz Que construiu o país Sofrer neste desatino Pois mesmo com a estiagem Não tem mais linda paisagem Que a do solo nordestino.
Oh ! Jesus meu redentor Dos altos céus infinitos Abençoai meus escritos Por vosso divino amor Leciona um trovador Com divina inspiração Para que vossa paixão Seja descrita em clamores Desde o princípio das dores Até a ressurreição.
Dentro do livro sagrado São Marcos com perfeição Nos faz a revelação De Jesus crucificado Foi preso e foi arrastado Cuspido pelos judeus Por um apóstolo dos seus Covardemente vendido Viu-se amarrado e ferido Nas cordas dos fariseus.
Dantes predisse o Senhor Meus discípulos me rodeiam E todos comigo ceiam Mas um me é traidor Só a mão do pecador Meu corpo ao suplicio vai Porém vos digo que vai Do homem que por dinheiro Transforma-se traiçoeiro Contra o filho de Deus Pai.
Todos na mesa consigo Clamavam em alta voz Senhor, Senhor qual de nós Vos trai dos que estão contigo Disse Cristo: é quem comigo Juntamente molha o pão E todos me deixarão Mas São Pedro respondeu Mestre garanto que eu Não vos deixarei de mão.
Em verdade deixarás Nesta noite sem tardar Antes do galo cantar Três vezes me negarás Pedro com gestos leais Disse em voz compadecida Eis-me a morte preferida Mas não serei teu contrário Ainda que necessário Me seja perder a vida.
Estava tudo benquisto Com Pedro dizendo igual Até na hora fatal Da prisão de Jesus Cristo Então quando se deu isto Pedro a espada puxou Num fariseu despejou Um golpe tão destemido Que destampou-lhe o ouvido Quando a orelha voou.
Ouviu a voz sublimada De Cristo em reclamação Dizendo em repreensão Pedro guarde a tua espada Deixa não promovas nada Porque tudo é permitido Não sejas enfurecido Não tentes e nem te alteres Pois se com o ferro feres Com ele serás ferido.
Jesus na frente seguia Na hora que lhe prenderam Todos discípulos correram Mas Pedro atrás sempre ia De longe coitado via Jesus de queda e de trote Sobre as mãos do grande lote Cada bordoada um passo Até chegar no terraço Da casa do sacerdote.
Depois da tropa chegada Jesus foi interrogado Bastantemente acusado E Pedro viu da calçada Quando veio uma criada Perguntando com rigor - Tu és acompanhador Do que está preso aqui? Pedro disse: eu nunca vi Nem conheço esse senhor.
QUATRO MESTRES DO IMPROVISO E UM FOLHETO DE DEBATE
Dimas Batista (1921 – 1986)
Dimas Batista
Nasci no sertão, desfrutando as virtudes Do tempo de inverno, fartura e bonança. Depois veio a seca, fugiu-me a esperança Deixando-me assim, de tristeza tão rude. Vi secos os rios, fontes e açudes. E eu que gostava tanto de pescar, Saí pelo mundo tristonho a vagar, Fui ter numa praia de areias branquinhas E vendo a beleza das águas marinhas, Cantei meu galope na beira do mar.
Ali na cabana de alguns pescadores, Fitando a beleza do mar, do arrebol, Bonitas morenas queimadas de sol, Alegres ouviram cantar meus amores. O vento soprava com leves rumores, O pinho a gemer, depois de chorar. Aquelas morenas à luz do luar Me davam impressão que fossem sereias, Alegres, risonhas, sentadas nas areias, Ouvindo os meus versos na beira do mar.
Eu sempre que via, lá no meu sertão, Caboclo vaqueiro de grande bravura, Vestido de couro, na mata mais dura, Entrar pelo mato e pegar o barbatão, Ficava pensando, na minha impressão: Não há quem o possa, em bravura igualar; Mas depois que vi o praiano pescar Numa frágil jangada, ou barco veleiro, Achei-o tão bravo, tal qual o vaqueiro, Merece uma estátua na beira do mar.
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Sebastião da Silva
Sete letras da saudade com as três letras da dor, as seis letras da paixão com as quatro letras do amor são sentimentos que moram no peito do cantador!
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É de Princesa Isabel este vate popular; pode ser príncipe dos versos, que Princesa é seu lugar; quem é filho de princesa é príncipe onde chegar.
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Pra levar Dimas Batista, a morte perversa veio; levar o mais novo é triste; levar o mais velho é feio. Deus, respeitando os extremos, mandou buscar o do meio!
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Foi à forca Tiradentes com a maior paciência; seu sangue se derramava, e a terra, por inocência, bebia o sangue de um filho que quis dar-lhe a independência.
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Onésimo Maia
Com a minha cantoria estou vivendo tranqüilo: urubu não ganha fama, não canta, não tem estilo! Todo dia come carne, Sem saber quanto é um quilo!
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A mulher veio pedir que eu passe o Natal com ela, mas eu vou ganhar dinheiro pra trazer o comer dela; que é melhor faltar na cama do que faltar na panela.
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Eu voto em Zé Agripino, que é santo da minha Sé, porque me deu um emprego que garante o meu café: sou o vigia de um grupo que inda sei onde é.
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Da casa de Lima Neto, quando você se aproxima, a empregada diz logo: – Venha correndo, seu Lima! Chegou o cantador torto que o gambá mijou em cima!
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Ele é bom pai para os filhos E um bom filho para Deus. Eu sempre fui o canário Das festas dos filhos seus, Pois, do alpiste dos dele, Eu ganho a ração dos meus.
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Quando eu vier outra vez, seu filho já está crescido; essa moça tem casado, já tem largado o marido; sua mulher tá com outro e o senhor já tem morrido.