UM MOTE BEM ATUAL E SETE MESTRES DO REPENTE
* * *
Dimas Batista
Há diversos cantores do sertão
que não têm sentimento nem receio
de cantar nos salões serviço alheio,
de Raimundo Pelado e Azulão,
de Zé Duda ou Manuel do Riachão,
maltratando os colegas com lamúrias.
Descarrego em um destes minha fúria,
porque sempre abomino o vitupério,
eu só canto com homens de critério,
pois cantar verso alheio é uma injúria.
Basta um cabra não ter disposição
pra viver do serviço de alugado,
pega numa viola e bota ao lado,
compra logo o “Romance do Pavão”,
a “Peleja do Diabo e Riachão”
e a “História de Pedro Malazarte”.
Sai no mundo a gabar-se em toda a parte
e a berrar por vintém em mei da feira.
Parasitas assim desta maneira
é que têm relaxado a minha arte.
Inda existem diversos poetaços
que, além de banais, são pervertidos,
namoristas, gabolas, enxeridos,
imprudentes, pedantes e devassos,
que nas partes que andam, deixam traços
comprovantes de infames impostores.
Denuncio estes vis conquistadores,
porque deles tornei-me adversário.
Qualquer pai de família é necessário
ter cuidado com certos cantadores.
Não faz nojo a catinga dos timbus,
nem das feras carnívoras da mata,
não faz nojo a matéria putrefata
que alimenta os famintos urubus.
Das hienas, chacais e caititus,
nojo algum me provoca aquele cheiro.
Os micróbios que há no mundo inteiro
não me fazem ficar nauseabundo.
Só o que me faz nojo neste mundo
é a língua de um cabra fuxiqueiro.
Poetinha imoral, indecoroso,
pra cantar não me chame, que eu não canto,
se sentado ao meu lado, eu me levanto,
não dou gosto a cantor escandaloso,
porque todo indivíduo audacioso
tem baixezas que a honra lhe consomem.
Eu só canto com homem mesmo homem,
cabra ruim não escuto dois minutos,
que quem dá liberdade a certos brutos
tá comendo no cocho que eles comem.
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Arimatéia Macêdo
Fui criado conhecendo a poesia,
De cantadores repentistas nordestinos,
Meu velho pai era um desses paladinos,
Que versava com imensa maestria,
Eles faziam rimas com enorme alegria,
Neste instante eram muito ovacionados,
Pelos versos que teriam recitados,
Nas rezas, nos clubes, e até na gafieira,
Apreciei alguns artistas consagrados,
Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Conheci João Furiba e Zé Ferreira…
Valdir Teles, Zé Cardoso e Gavião…
Elomar, Antônio Ferreira e Azulão…
Marcolino, Mestre Chico e João Bandeira…
Sílvio Grangeiro, Ismael e Zé Pedreira…
Pedro Bandeira e Vilanova renomados…
Dos festivais têm saído premiados…
Assim como Louro Branco e Quixabeira…
Apreciei alguns artistas consagrados…
Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Geraldo Amâncio, Marreco e Marcolino,
Zé Batista, Daudeth e Chico Bandeira,
Jomaci, Cravo Branco e Paulo Pereira,
Zé Vicente, Zé Cardoso e Laurentino,
Pinto do Monteiro, Sebastião e Clementino,
Diniz Vitorino e Lourinaldo laureados,
Otacílio e Lourival são diplomados,
Oliveira de Panelas é de primeira,
Apreciei alguns artistas consagrados,
Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
Conheci Jotão e Alexandre Ribeiro…
Mouzinho, Lourenço e Antônio Lisboa…
Sebastião, Fenelon e Arnaldo Pessoa…
Antônio de França e Guriatã de Coqueiro…
Zé Galdino e Miguelzinho Violeiro…
Patativa era um dos mais celebrados…
Os seus escritos foram muito bem gravados…
Pude assistir a Rouxinol e a Lavandeira…
Apreciei alguns artistas consagrados…
Bem na sombra do loureiro e da oliveira.
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Valdir de Lima
Lembrança não me faz medo
Nem choro não me faz dó:
Eu te mando sair daqui
Te meto no xilindró…
Se resmungar, leva peia!
Se chorar leva cipó!
Eu pegando uma viola,
Não sirvo de mangação:
Sou que nem onça no inverno
E cascavel no verão!
Cantador metido a duro
Me vem pedir a benção.
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Sebastião Cândido dos Santos
Já nasci assim
Sou cabra valente
Minha fama é na cantiga
Sou feroz é no repente
Colega, tome cuidado,
Escute, fique ciente:
Eu, pegando um cantador
Sou pior que dor de dente!
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Cego Aderaldo
A tua cintura fina,
De corpo de manequim
Tem este formato assim,
Porque fostes bailarina
O esporte de grã-fina.
Mas sem querer fazer troça,
Com quem dança e canta bossa
Eu afirmo sem temor,
Se praticares amor,
Em pouco tempo ela engrossa.
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Maurício Menezes
Procurei encontrar inspiração
Num recanto de terra pequenina
Pra fazer um poema em descrição
Das histórias da vida nordestina
Mas olhando para a força dessa gente
Vi que um verso não é suficiente
Pra mostrar a beleza do que vejo
Um poema seria um disparate
Não há verso no mundo que retrate
A grandeza do povo sertanejo.
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Otacílio Batista
Eu nasci lá no velho Pajeú,
São José do Egito é minha cidade
Comecei com dezessete de idade,
Imitando a voz do uirapuru.
Nesta hora canto eu e cantas tu,
Que a minha cantiga nada afeta
É preciso ter uma ideia concreta
Que o povo entenda o que é cantoria
E se poeta vencer-me em poesia,
Não direi a ninguém que fui poeta.